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terça-feira, 16 de setembro de 2008

Luis Nassif: Lula, Satiagraha e a Real Politik

O jornalista Luis Nassif publica nota sobre um acordo do governo Lula com a Editora Abril para abafar a Satiagraha.

Luis Nassif é um jornalista sério, mesmo que discordemos dele algumas vezes quando entra no campo da opinião, mas é sério, diferente de PHA.

Nassif não mostra provas. Deve ter informações em off, de fontes que ele acha confiável.

Assim a nota pode ter seu lado verdadeiro, mas avançou muito o sinal nas conclusões.

Vamos ponto a ponto:

1) Se Lula e Dilma fizessem tal acordo com a Editoria Abril, ficariam na mão da editora. Seria mais um dossiê na gaveta para ser usado quando a Veja quisesse, até 2010. Todo mundo sabe que a Abril não é confiável. Por isso, dentro da Real Politik, não faz sentido, jamais desta forma. Lula resistiu ao mensalão sem acordo com a Veja quando estava fraco, porque faria algo do gênero agora que está forte?

Obs: aparecerá centenas de engraçadinhos dizendo que a participação de ministros de Lula no seminário dos 40 anos da Editora Abril é "prova do acordo". Se Lula fosse tão burro de fazer um acordo secreto e dar sinais para todo mundo ficar sabendo em um evento público, jamais teria chegado à presidência da república e muito menos sido reeleito.

2) Em época que ninguém sabe quem está gravando quem, acordos deste tipo não são selados por conversas entre pessoas que desconfiam umas das outras. Se um deles for gravado pode ser o fim da carreira política. Só haveria espaço para acordos por gestos políticos, sem encontros e sem conversas seladas. Nassif ou sua fonte pode estar interpretando gestos como sendo sinais de acordo, o que é válido, mas seria preciso ressalvar que trata-se de interpretação.

3) A fonte de Nassif pode ser a mais confiável possível à ele, e pode ser de dentro do Planalto. Mas sendo verdade, mentira ou meia-verdade o que diz, não seria aliada de fato nem a Lula, nem a Dilma (ainda que pareça ser). Representaria um grupo no governo em conflito justamente com Lula e Dilma. Pois se ambos tivessem feito tal acordo, jamais interessaria vazá-lo.

Palácios são e sempre foram locais habitados por gente com punhais afiados preparados para usá-los quando o momento é oportuno, entre desafetos que disputam espaços pelo poder, e podem voltarem-se contra as costas do próprio presidente. É a real politik, também.

Por isso, mesmo "fontes do planalto" pode estar falando apenas por um grupo, brigando pelo poder, e plantando a versão que lhes interessa.

4) A Satiagraha abriu o leque demais. A investigação inicial tinha como foco: apurar crimes financeiros (e de corrupção) através do Opportunity Fund em Cayman, para tentar chegar a nomes de políticos envolvidos no mensalão, a partir da injeção de dinheiro pela Telemig Celular e Amazonia Celular de Daniel Dantas nas agências de Marcos Valério.

Abrindo a caixa preta do Opportunity Fund em Cayman, atinge sobretudo a privataria tucana.

Aprofundando no financiamento do "mensalão", muitos políticos que ficaram de fora podem ser alcançados numa repescagem das investigações.

- os petistas foram devassados e tem pouco a perder (talvez apareça uma ou outra prova que ainda não apareceu contra um ou outro petista), mas quem tem muito a perder são aqueles que não foram devassados:
- correu notícias no fim da CPI dos correios, que um grande lote de parlamentares do PMDB também receberam dinheiro do esquema Marcos Valério e ficaram de fora das investigações. Apenas o deputado José Borba do PMDB foi incluído.
- o governo tucano de Aécio Neves, em MG, grande cliente de Marcos Valério, ficou de fora.
- também foram grandes clientes de Marcos Valério na época do mensalão, os governos de Joaquim Roriz (PMDB/DF) e Marconi Perillo (PSDB/GO), e também foram poupados das investigações até agora.

São muitos interesses que convergem contra a Satiagraha. Não só da oposição, mas também setores do PT envolvidos no mensalão, e o PMDB é a maior bancada de sustentação ao governo federal e tem vários ministérios. Lutam e fazem pressão para não serem investigados.

O governo pode estar fazendo acenos aos meios políticos conciliatórios para aliviar a pressão, mas na verdade é jogo de cena, porque mesmo que quisessem, não podem fazer muita coisa, porque o MP acompanha o trabalho da PF, tem cópias dos materiais apreendidos, e qualquer interferência do governo sobre o trabalho policial, voltaria contra o próprio governo, e com provas fatais que levariam ao impeachment, ao contrário das ilações políticas em CPI's. Também é a Real Politik não brigar com provas criminais.

5) Os grampos levantaram suspeitas de tráfico de influência no governo atual, com citações de Dilma, e gravações de Gilberto Carvalho.

Isso sim deve ter causado incômodos em Dilma e Lula. Acho razoável que a partir do momento que as gravações não mostram envolvimento de ambos (pelo contrário, mostra negativa às investidas), que eles não aceitem bovinamente ser foco de investigação por mero interesse político da oposição, para a oposição abrir processo faz-de-conta, apenas para colocar ministros na "lista suja" durante a campanha de 2010.

Se o MP, que é independente, entender investigar, que o faça, mas não cabe à Polícia Federal fazer um serviço político para a oposição por conta própria, sem maiores evidências e sem que o MP acione.

Esse gesto de Dilma é que pode estar sendo interpretado, de forma errada, como uma iniciativa de abafar toda a Satiagraha. E isso sim pode ter colocado Dilma contra Protógenes.

Mas ainda acredito que Protógenes foi afastado por quebra de hierarquia na Polícia Federal. Se ele apresentasse provas contra seus superiores, ele teria ficado e seus superiores teriam saído. Mesmo que o governo não quisesse, a justiça respaldaria Protógenes.

Na Satiagraha não apareceu nenhum grampo que comprometa Policiais Federais, como em outras operações da PF, e Protógenes teve total controle sobre a investigação por mais de um ano. Protógenes suspeita contra outros policiais, mas ele mesmo não conseguiu produzir provas, pelo menos por enquanto. E condenar os superiores dele por presunção de culpa fica inviável. Manter ele levaria toda a cúpula da PF a pedir demissão ou perder o controle sobre os 11.000 policiais por falta de autoridade.

6) Quanto ao afastamento de Paulo Lacerda por pressões políticas, pode acontecer. Palocci também foi afastado contra a vontade de Lula, porque havia virado um foco permanente de ataques políticos, e mesmo que quisesse continuar não teria a menor condição exercer com desenvoltura suas funções no Ministério. O mesmo pode estar acontecendo com Paulo Lacerda. Mesmo assim são apenas possibilidades, ainda aguardamos os acontecimentos, antes de tirar qualquer conclusão.

8) A fonte de Nassif, pode não ser do Planalto, nem do Congresso. Pode ser gente da Polícia Federal ou da ABIN, mas aí já tem uma boa dose de achômetro quando extrapolam o que viram para os gabinetes do Planalto, que não viram.

9) Se o governo fosse contra o trabalho da PF e quisesse interferir, ficaria nas mãos dos agentes da PF que fizessem qualquer trabalho sujo.
Correria o risco de algum aloprado ser pego pelo MP. E sempre poderia haver no grupo um delegado, ou honesto demais que denuncie por interesse público, ou desonesto demais que denuncie para favorecer a oposição.

Como se vê, mesmo dentro da Real Politik, o governo não tem outra escolha que não seja o caminho da legalidade: apurar tudo e fazer cumprir a lei.

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