O discurso do presidente Lula, na Favela de Manguinhos, no Rio de Janeiro.
"...O governo federal, o governo estadual, eu não sei se a prefeitura também, um pouco... Então, o governo federal, o governo estadual e a prefeitura estão investindo aqui 358 milhões de reais. Trezentos e cinqüenta e oito milhões de reais que nós estamos investindo aqui para atender o quê? Nós vamos atender, na verdade, numa área de 490 mil metros quadrados, 11 mil e 800 famílias. Nós vamos fazer sistema de abastecimento de água, vamos substituir a adutora que tem hoje, vamos fazer um quilômetro e meio de adutora, vamos fazer 12 mil e 230 metros de rede de distribuição de água, sistema de esgotamento sanitário com 12 quilômetros, sistema de drenagem pluvial, sistema de iluminação pública. Cerca de mil e 800 moradias serão construídas, 775 serão adquiridas e outras 350 reformuladas. Um viaduto com dois quilômetros de extensão, o viaduto e a elevação, nós vamos elevar a linha de ferro – onde hoje é chamada Faixa de Gaza – e embaixo vamos fazer um pequeno centro de lazer e área comercial para o povo vender as suas coisas e desenvolver a região. Nós vamos fazer parque metropolitano com ciclovia, teatro, comércio popular, quiosque de alimentação, área de lazer e cultura, com ciclovias de cinco quilômetros de extensão. Nós vamos fazer anfiteatro e lazer infanto-juvenil; comércio popular com 47 quiosques para alimentação e 50 boxes para comércio e serviços; centro esportivo com campo de grama sintética, uma quadra poliesportiva coberta e outra descoberta, piscina, duas pistas de skate e vestiários. Vamos fazer mais: dois centros comunitários, centro de serviços com posto policial, correios, sala para programas sociais e também com banheiros públicos; centro sociocultural; centro de referência para a juventude, para jovens de 15 a 24 anos, com projetos e cursos de capacitação para o mercado de trabalho, atividades culturais e esportivas, pré-vestibular, informática e auditório; duas escolas de ensino médio, sendo uma de referência;
escolas técnicas profissionalizantes; ambulatório médico especializado. Estas são algumas coisas que vão acontecer aqui na região de Manguinhos.
E por que nós estamos fazendo isso? Quando, em dezembro de 2006, a gente pensou em fazer o PAC, eu pedi para a ministra Dilma conversar com os companheiros do Rio de Janeiro, porque eu estava cansado de ver na televisão ou ler nos jornais que todo dia tinha uma notícia do Complexo do Alemão, todo dia tinha uma notícia de Manguinhos, todo dia tinha uma notícia da Rocinha, mas nenhuma notícia boa. Só para você saber, Governador, o nosso querido Leonardo, aqui, tem uma bala perdida na perna dele. Pois bem, eu estava cansado dessas notícias e eu sei que para a gente mudar isso é preciso que a gente ofereça, em nome do Estado brasileiro, esperança para milhões de jovens neste País. Se o Estado não estiver presente com educação, com escola, com lazer, com cultura, com emprego e com melhorias das condições de vida, o jovem não tem outra saída. Se não tem a prefeitura, não tem o estado, não tem a União, não tem educação, não tem saúde, não tem perspectiva de vida, o que ele vai pegar? A primeira coisa que se apresentar próxima dele, e aí pode ser coisa ruim, pode ser coisa desagradável, que leva o jovem a morrer antes de virar adulto.
Então, era preciso que tivesse uma intervenção muito pesada do governo, mas não uma intervenção com a polícia, não uma intervenção para fazer guerra, além das guerras que as pessoas já têm. Uma intervenção para a gente cuidar de garantir às pessoas de bem, às mulheres e às crianças deste Complexo viverem uma vida digna, não serem achacadas por traficantes, não
serem molestadas, e que seus filhos possam ter a opção de estudar e trabalhar decentemente, ajudar a construir a sua família, casar, construir família. É isso que nós queremos para todos nós, mas se a gente permite que as pessoas morem apinhadas em barracos de dois ou três metros quadrados, em que no mesmo quarto dormem, no mesmo quarto cozinham e no mesmo quarto fazem as suas necessidades fisiológicas, as pessoas vão deixando de ser racionais e vão virando pessoas irracionais, porque não têm nunca uma mão estendida, a figura do município nunca está presente, a figura do estado nunca está presente e a figura do governo federal nunca está presente.
Quantas vezes já vieram os presidentes da República às favelas do Rio de Janeiro? Quantas vezes? O único momento em que pobres e favelados são tratados como cidadãos de primeira classe é no dia da eleição, em que dão mais importância para os pobres do que para os ricos. Certamente, vocês nunca viram um candidato a presidente, a governador, a prefeito, a vereador, a deputado e a senador, falar mal de pobre. Falam mal de banqueiros, falam mal de ricos, mas depois que ganham quem é que vai jantar com eles? Essa é a chave do problema: é de que lado que a gente está e para quem a gente quer governar de forma prioritária. O Sérgio tem obrigação de governar para todos no Rio de Janeiro, para ricos e para pobres. Eu tenho obrigação de governar para ricos e para pobres, mas eu tenho que saber que o meu lado é fazer com que os pobres ganhem cidadania neste País, melhorem de vida, tenham acesso às coisas.
Por isso, nós discutimos e pegamos as quatro coisas mais importantes: Complexo do Alemão, Manguinhos, Rocinha, Pavão e Pavãozinho. É quase 1 bilhão de reais nesses quatro lugares. Não é para fazer uma ruazinha na véspera de eleição, porque o Governador não tem eleição este ano. Eu não posso mais concorrer porque termina o meu mandato. É porque eu acho que nós precisamos resgatar a decência e a dignidade. Quando eu vejo mulheres com roupa de trabalho, que já fizeram curso por conta das obras do PAC, essas mulheres serão muito mais respeitadas pelos seus próprios companheiros porque irão levar para casa uma parte daquilo que vai alimentar os seus filhos, dinheiro ganho às custas do suor e do sangue dessas pessoas, é isso que nós queremos.
É preciso acabar com essa história de vender a imagem de que todo mundo é bandido, de que tudo não presta, é preciso acabar com essa história. Em um pé de laranja, quando tem uma podre a gente não corta o pé, a gente arranca a podre. Se tem bandido, eles têm que pagar o preço, mas não podemos levar violência para os homens e mulheres honestos deste País, que ficam amedrontados. É por isso que, amanhã, o Governador e o Ministro da Justiça vão assinar um programa. Nós estamos dando bolsa para os policiais do Rio de Janeiro se formarem, se prepararem melhor. Quando eles vierem para cá e virem um de vocês na rua, que eles não vejam em primeiro lugar um bandido, que em primeiro lugar eles vejam um carioca, um brasileiro, um homem ou uma mulher que quer o bem, quer trabalhar, quer estudar, quer educar seus filhos, quer ter acesso ao lazer e quer viver condignamente. É este País que nós estamos iniciando agora, é nesse País que a gente quer mudar as histórias de algumas pessoas, como o senhor Roberval. Ele diz que pior do que o barulho do trem, é o barulho do tiroteio. São balas de fuzil passando para lá e para cá. Na hora do tiroteio, o jeito é se jogar no chão com a mulher e os quatro filhos pequenos e rezar, rezar bastante para que uma bala não chegue lá. Isso não é vida digna e nós precisamos mudar essa situação.
Como também não é justo que os filhos da dona Roseane tenham que dormir na cozinha do barraco, porque o esgoto corre pelo quarto das crianças e escorre pela rua da comunidade Nova Mandela atraindo ratos, baratas e mosquitos. Como também não é justo que cinco dos filhos dela e mais o marido tenham contraído dengue no final do ano passado, sendo que o Isac, que só tem
11 anos, quase morreu. O senhor Roberval, a dona Roseana e os companheiros todos que estão aqui sabem, os moradores da comunidade sabem que cada brasileiro e cada brasileira tem o direito a uma vida digna – isso está na Constituição – longe da fome, da dengue, da leptospirose, da hepatite e da violência.
Companheiros e companheiras,
Este é um momento histórico para o Complexo de Manguinhos. Eu quero dizer para vocês que além de tudo que já aconteceu aqui, tem pessoas que eu quero que vocês olhem bem na cara delas. O Pezão, pode vir aqui na frente, a Dilma Rousseff, o Márcio – não estou nem chamando o Governador e eu – e a Maria Fernanda, porque a Maria Fernanda é a mulher da Caixa, é ela quem vai cuidar das habitações aqui, com financiamento. Pois bem, o Márcio é ministro das Cidades. Agora, este homem aqui, que é vice-governador, e esta mulher aqui, que é a ministra-chefe da Casa Civil, serão os chefes para olhar a cada dia, a cada semana, a cada mês, as obras do PAC. E quero dizer aos nossos amigos empresários: vocês não estão apenas fazendo uma obra como outra qualquer para ganhar dinheiro, também vão ganhar dinheiro. Eu quero dizer para vocês, para cada empresário que assinou o contrato aqui, que além do prazer de vocês ganharem o dinheiro a que vocês têm direito, vocês têm que colocar no coração que, mais do que obra, vocês estão devolvendo o prazer à vida e o direito à cidadania a homens e mulheres da periferia do Rio de Janeiro, que merecem e que brigaram por isso a vida inteira.
Companheiros e companheiras,
Eu estou aqui com o companheiro Cristiano. Ele hoje saiu na primeira página do Extra, a mãe dele é a Bianca. Ela mora numa casa num lugar de risco, em cima da adutora. Ela vai ter que sair de lá, obviamente, não pode ficar lá. O Cristiano aparece na foto tomando banho num vazamento de água. O sonho do Cristiano é ter uma piscina para nadar. A gente não vai dar uma piscina para o Cristiano, a gente vai dar piscina para o povo de Manguinhos. Lá, o Cristiano e os outros irmãozinhos dele do Complexo vão poder ter professor de natação, professor de educação física e vão ter condições de ter um futuro melhor do que aquele que nós tivemos no passado.
Eu quero dizer para as crianças e para os adolescentes que estão aqui: Vocês nunca podem perder a esperança, não tem nenhuma razão para um jovem, por estar desempregado ou por ter brigado com a mãe ou com o pai, trabalhar para a bandidagem, não tem.
Eu sou filho de uma mulher que nasceu e morreu analfabeta, eu sou filho de uma mulher que morou em lugar que dava enchente de 1,5m dentro de casa. Acordava à meia-noite com rato, com barata, com fezes dentro do quarto. Era obrigado a me levantar e levantar os poucos móveis que tinha, não tinha nem geladeira e nem televisão. Morei em uma rua em que nos dias de chuva a gente não conseguia ir trabalhar, de tanto barro. Era obrigado a colocar uma galocha, chegar no asfalto, tirar a galocha, colocar no bolso e levar para trabalhar. Eu sei o que é a vida de vocês. Mas em nenhum momento da minha vida, por conta do respeito que eu tinha à minha mãe... quando eu era moleque, eu conto sempre, Sérgio, eu saía da escola, numa rua chamada Silva Bueno, eu tinha uma vontade de comer uma maçã, que era uma coisa de louco – e naquele tempo só tinha maçã argentina, eram umas maçãs grandes – muitas vezes, eu passava com vontade de pegar uma e sair correndo. Eu nunca peguei, porque eu tinha vergonha de envergonhar a minha mãe.
Agora, eu queria pedir para a juventude aqui: não há nenhuma razão para desespero, mesmo em uma situação adversa. Olhem o tempo que vocês têm de vida, 15 anos, 16 anos, 17 anos, 14 anos, vocês estão com a vida toda por construir. Se um nordestino como eu, que só tenho o diploma primário e um curso do Senai, chegou à Presidência da República, por que vocês não podem chegar?
A paz será construída a partir da atitude de cada um de nós. Não é o outro que tem que ser pacífico, somos nós. Por isso, eu quero parabenizar os companheiros das comunidades, porque vocês são verdadeiros heróis. Se dependesse das notícias dos jornais, a gente não tinha nem que se levantar, passaria o dia inteiro deitado aqui. Se dependesse de algumas manchetes, a gente não se levantaria, ficaria todo mundo deitado o tempo inteiro. Entretanto, eu sei que vocês estão demonstrando coragem, levantam-se não apenas para trabalhar mas, no mundo adverso, para organizar o povo de vocês. E muito mais importante é que este povo está aqui é a cara do povo brasileiro, meio preto, meio branco, meio índio, meio português. Não importa com que “meio” a gente seja, o que importa é que nós somos de corpo e alma brasileiros, seja negro, seja branco, e queremos construir uma Pátria livre e soberana, onde todos possam viver condignamente.
O meu compromisso e deste companheiro é acabar com isso aqui o mais rápido possível. A gente não vai vir aqui anunciar e esquecer, não. Eu dizia para o Sérgio: Se eu fosse você, todo mês passaria para visitar a obra. Se o Pezão não estiver cuidando direito, você puxa a orelha do Pezão. Me telefona, e eu puxo a orelha da Dilma. Se o Pezão e a Dilma não estiverem cuidando, eu puxo a orelha dos dois. Até esta obra ser inaugurada, eu quero vir aqui. Quero vir aqui com o maior carinho, para rever o Cristiano já nadando na piscina, para ver a Bianca morando numa casa decente e para ver vocês com este sorriso maravilhoso no rosto dizendo: apesar de tudo, vale a pena a gente sorrir, acreditando que o amanhã será melhor do que o ontem.
Um abraço e um beijo para todos vocês.
Deixem-me contar uma coisa para vocês. Eu sou, antes de tudo, um esportista. O companheiro aqui sabe que eu sou vascaíno, junto com o Sérgio. Pois bem, mas a gente não pode deixar de ter orgulho do que o Flamengo representa para o Rio de janeiro e para o País.
Um abraço e obrigado, querido.
-
0 Comentários:
Postar um comentário
Meus queridos e minhas queridas leitoras
Não publicamos comentários anônimos
Obrigada pela colaboração