Um conjunto de dois decretos e quatro portarias da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo publicados na última sexta-feira colocou em polvorosa os segmentos de higiene pessoal, perfumaria e bebidas alcoólicas. As novas normas estaduais implantam, a partir de 1 de janeiro o sistema de substituição tributária para o recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nesses segmentos.
Na substituição tributária a indústria antecipa o recolhimento do ICMS de toda a cadeia comercial até a venda ao consumidor final. As empresas alegam que as margens de valor adicionado estimadas pela Secretaria da Fazenda para a antecipação do imposto são maiores que as de mercado ou que as praticadas em outros Estados. Os índices de valor adicionado estabelecidos para os três setores variaram de 125,54% e 165,55% . Essas margens devem ser acrescidas ao preço do produto para o cálculo do ICMS. A substituição também foi estabelecida para o setor de medicamentos, mas as margens ainda não causaram polêmica.
Em nota, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), João Carlos Basilio da Silva, diz que as margens são "extremamente exageradas" quando comparadas aos índices aplicados em outros Estados. Em Minas, informa, a margem é de 34,87%. A margem estabelecida por São Paulo para diversos produtos de higiene pessoal é de 125,54%. A Secretaria da Fazenda de São Paulo, procurada, não se manifestou até o fechamento da edição.
Silva explica diz que a medida provocará aumento de preços e encolhimento no consumo de toda a cadeia dos produtos de higiene pessoal, causando desemprego, e aumento de inflação destes produtos. "Estimamos que os produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos terão dentro do Estado de São Paulo os maiores preços no território nacional."
A Associação Brasileira de Alimentos e Bebidas (Abab) fez um pleito à Secretaria da Fazenda. Ela questiona a forma de cálculo da margem e pede que a nova norma vigore apenas a partir de 1 de abril de 2008. Segundo a Abab, a Fazenda dará uma resposta hoje.
A Adega Alentejana, especializada na importação de bebidas de Portugal, chegou a mudar seu calendário de atividades em função das novas normas. Ela informou aos clientes que o preço dos vinhos deverá aumentar 40% aproximadamente e que somente os pedidos entregues até hoje poderão ser atendidos com os preços da tabela atual. Em razão de dúvidas sobre os decretos, a adega suspendeu as vendas para o Estado de São Paulo entre os dias 2 e 5 de janeiro. A gerente comercial da adega, Vera Vilaça, diz que a agenda original da Alentejana era estar em atividade nesses dias. "Além das dúvidas, precisamos nos adaptar porque deverá haver mudanças nos documentos fiscais", acrescenta.
A importadora de bebidas Mistral acredita que a mudança no recolhimento do ICMS gere um impacto de cerca de 30% no preço dos vinhos, mas ainda não está definido se esse impacto será repassado aos consumidores.
As novas normas alteraram também o plano de vendas de fim de ano de algumas companhias. O advogado Luís Alexandre Barbosa, do Felsberg e Associados, foi tirado do descanso da véspera de Natal para orientar no próprio dia 24 de dezembro um fabricante de sabão em pedra que deverá ser afetado pelas medidas, pois o produto está classificado como higiene pessoal. "A margem para esse produto será de 125,54% quando a margem efetiva de mercado é de 20% a 35%." A empresa, diz, está tentando efetivar toda a saída de mercadorias possível até 31 de dezembro, antes que a antecipação entre em vigor. "O setor tenta questionar o assunto junto à Secretaria de Fazenda e também estuda a possibilidade de medidas judiciais."
Uma das possibilidades, diz Barbosa, é entrar com ação judicial para que a aplicação da nova margem respeite o prazo de noventa dias previsto para elevação de impostos. O receio, diz, é que a Justiça não considere a medida como elevação de imposto e sim como simples antecipação do tributo. "A escolha é entre o risco de uma ação judicial e a perda de mercado, ao menos num primeiro momento."
Martinho de Paiva Moreira, vice-presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas), acredita que a mudança afetará bastante a cadeia de suprimento do setor supermercadista. Segundo ele, as margens de mercado são menores do que os percentuais atribuídos. "A simples fixação de uma margem de lucro comum para o varejo já é por si um equívoco." Martinho acredita que as indústrias poderão aumentar os preços.
Silva, presidente da Abihpec, também critica a aplicação de uma única margem a todo o segmento de higiene pessoal, inclusive a produtos com alíquotas diferentes de ICMS. Os protetores solares que são onerados com alíquotas de 18% terão as mesmas margens que produtos que pagam 25% e os cremes dentais, tributados a 12%. "É obvio que quanto maior a tributação, maior é a margem." A associação, diz ele, apóia a antecipação do ICMS, mas critica o que considera uma medida arbitrária para definição das margens. "As medidas pegaram as empresas de surpresa. Os segmentos ainda aguardam um estudo ainda a ser concluído pela Fundação Getulio Vargas (FGV), que é uma referência na definição dos índices em vários Estados", diz o advogado Barbosa.
O advogado Antonio Carlos Salla, do Machado Associados, lembra que as margens podem tornar mais vantajosa a compra em fabricantes instalados em outros Estados. Para os setores de higiene pessoal, perfumaria e bebidas alcoólicas as novas normas estabelecem uma margem menor para as compras interestaduais. Os fabricantes paulistas de produtos de higiene pessoal, por exemplo, irão recolher antecipadamente o ICMS sobre uma margem de 125,54%. Para os produtos comprados de outros Estados, a margem será de 64,21%. "É verdade que atualmente os fabricantes do setor estão concentrados em São Paulo, mas isso sem dúvida é uma porta de saída dos investimentos para outros locais."
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