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quinta-feira, 15 de maio de 2008

Nota fria & caixa dois

O senador Marconi Perillo (PSDB-GO) e o governador de Goiás, Alcides Rodrigues Filho (PP), formavam uma dupla de sucesso no mundo político até semanas atrás. Depois de governar o Estado por dois mandatos, Perillo elegeu-se senador em outubro de 2006, com 75% dos votos, e ainda transformou seu vice, o então desconhecido Rodrigues Filho, o Cidinho, em seu sucessor no governo. Na manhã de 10 de março, o Ministério Público Federal finalizou uma denúncia devastadora contra os dois. Num processo que tramitou em segredo de Justiça, o procurador-geral da República Antonio Fernando Souza denunciou a dupla ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelos crimes de formação de quadrilha, peculato, caixa dois, uso da máquina pública e uso de notas frias e laranjas (alguém cuja identidade é usada para encobrir o verdadeiro criminoso) para fraudar a eleição de 2006. Se for aceita pelo STF, a denúncia pode encerrar o sucesso da dupla goiana. Nas 16 páginas do documento de acusação, divulgado com exclusividade por epoca.com.br, o procurador-geral Antonio Fernando Souza descreve uma investigação da Polícia Federal que produziu cinco CDs com escutas telefônicas de uma dezena de pessoas. O relator do processo no STF será o ministro Ricardo Lewandowsky. As acusações mais graves são contra Perillo, suspeito de ter voado durante a campanha em aviões do governo do Estado e de ter usado policiais militares como seguranças pessoais. Por isso, o senador é acusado do crime de peculato (apropriação ilegal de recursos públicos).

A denúncia diz que Perillo e Rodrigues usaram notas frias e laranjas para justificar o dinheiro sujo na campanha

“O senador Marconi Perillo e o governador de Goiás, Alcides Rodrigues, foram os mentores e principais beneficiários de um esquema de captação ilícita de recursos, utilização de notas frias, pagamentos de despesa de campanha por meio de ‘laranjas’ e outras fraudes eleitorais”, escreve o procurador-geral Antonio Fernando. O advogado de Perillo, Antonio Carlos Almeida Castro, o Kakay, nega que ele tenha usado o avião do governo na campanha. Kakay diz que o procurador errou ao basear a denúncia nas escutas telefônicas sem ter ouvido antes os dois políticos. “Só lamento que eu não tenha sido ouvido pelo Ministério Público, porque já tinha esclarecido o que fosse necessário. Estou absolutamente tranquilo”, afirmou Marconi Perillo, por meio de sua assessoria. De acordo com sua defesa, Perillo usou apenas aviões particulares na campanha. ÉPOCA procurou a assessoria e os advogados do governador Rodrigues, mas não obteve resposta.

Na denúncia, organizada em tópicos, Antonio Fernando listou as supostas fraudes na campanha:

1 – para Antonio Fernando, houve fraude na alteração dos contratos de aluguéis de carros de som nas campanhas de Alcides e Perillo. Notas fiscais de gastos de Perillo teriam sido repassadas à campanha de Alcides para justificar um erro logístico percebido no fim da eleição: não havia sido contabilizada legalmente nas contas de Perillo nenhuma doação para esse tipo de serviço.

2 – uso de caixa dois por meio da Multcooper, empresa responsável pelo pagamento de funcionários dos dois candidatos. As notas fiscais apreendidas da campanha de Alcides também mostram pagamento de R$ 600 mil a uma empresa chamada Cantagalo Comunicação Ltda. Apesar do alto valor, esse pagamento não aparece na prestação de contas à Justiça.

3 – notas frias. O procurador-geral Antonio Fernando acusa os dois candidatos de apresentar notas fiscais frias para justificar gastos de campanha. Elas serviriam para justificar contas pagas com dinheiro de caixa dois.

4 – Marconi Perillo, Waldete Faleiros (contadora do PSDB de Goiás) e Lúcio Fiúza (caixa da campanha de Perillo) são acusados de tentar ocultar provas. Os diálogos interceptados entre 8 e 12 de dezembro de 2006 sugerem, de acordo com o MP, que os denunciados tiraram provas do comitê, a fim de obstruir a investigação.

PROVAS
Trecho da denúncia contra Perillo e Rodrigues. Condenados, eles perderiam o mandato

Escutas feitas no dia 8 de dezembro revelam que Waldete orienta Rodrigo, funcionário de um dos comitês, a esconder documentos e computadores:

Waldete – Agora que eu vi que tinha duas chamadas aqui. Pois é, era pra você sair daí, tirar o notebook, tirar os documentos...

Rodrigo – Deixa eu te falar: eles chegou de supetão (sic), eles pegou (sic) os documentos do PSDB, viu.

Waldete – Pegou tudo?

Rodrigo – Pegou.

Waldete – Ai, meu Deus...

Mais tarde, no mesmo dia, Waldete conversa com Lúcio:

Lúcio – Só levaram computador?

Waldete – Não. Levaram a documentação toda e os computadores.

Lúcio – A nossa documentação também?

Waldete – Não, a nossa tá comigo.

Lúcio – Deixa bem guardado. Não tinha nenhum papel, nenhum rascunho...

Waldete – Não tinha nada assim que comprometesse, a não ser por muita falta de sorte.

5 – o Ministério Público afirma ter provas de que Perillo e Rodrigues usaram servidores e bens públicos na campanha de 2006. De acordo com a investigação da Polícia Federal, os seguranças usados nas campanhas eram policiais militares estaduais em horário de expediente.

A interceptação de uma conversa de janeiro entre Perillo e Lúcio Fiúza foi resumida assim na denúncia: “Marconi avisa a Lúcio que pagou os funcionários da Fazenda e os seguranças, faltando agora o valor do salário dos sargentos, que ele não sabe. Diz que os sargentos vieram com uma conversa de ser 700 (reais), mas ele acha que é menos, pois eles estão recebendo uma parte do governo”.

Perillo é presidente da Comissão de Infra-estrutura do Senado, foi duas vezes governador de Goiás e é considerado hoje um nome promissor no PSDB. A parceria com Rodrigues, até há pouco seu aliado político, já começa a desafinar. Além do processo no STF, Perillo e Rodrigues devem responder a ação por crime eleitoral. Se condenados, eles correm o risco de perder o mandato e de ver o fim de uma dupla que prometia ir longe na política. (IstoÉ)

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