Na sexta-feira, 31 de julho, em Belo Horizonte o presidente Lula concedeu entrevista à Rádio Itatiaia de Belo Horizonte.
Áudio do trecho final da entrevista, onde o presidente fala sobre corrupção, ficha suja, Polícia Federal, Sarney.
Segue a transcrição do áudio acima:
Jornalista: A propósito, Presidente, como a gente sabe que nem o senhor e nem Jesus Cristo conseguiria fazer uma reforma política dos sonhos, o senhor acha, por exemplo, que iniciativas como essa da Igreja Católica, da CNBB, de que o cidadão, para entrar não apenas no Congresso Nacional, mas em uma Câmara dos Vereadores, para entrar em um emprego público de qualquer natureza, tenha a ficha limpa?
Presidente: Olhe, todo mundo que concorre a alguma coisa deveria ter ficha limpa. Veja, quando alguém vai ser candidato, o nome da pessoa fica público. Se essa pessoa tem alguma dívida com a sociedade, se a pessoa praticou corrupção, cometeu um crime, fez qualquer coisa, essa pessoa tem que ser denunciada antes de ser candidata, antes de ser candidata. Eu acho que vale para tudo. Vale para um concurso público, vale para qualquer cargo, as pessoas têm que ter... O pobre, quando faz um... Eu tomava conta da Previdência em 1972, quando o pobre requeria um benefício tinha que apresentar um atestado de pobreza. Eu acho que todos nós temos que andar com um carimbo de honestidade e de idoneidade na testa para que a sociedade, ao escolher um vereador, um deputado, um prefeito, um governador, um presidente, um senador, saiba que está escolhendo uma pessoa de bem. E se essa pessoa, depois de eleita, virar, o povo tem que ter o direito de afastar essa pessoa.
Jornalista: Bom, Presidente, a gente tinha prosa aqui para uns cinco dias, mas o senhor tem que ir lá com a Serraria cumprir a sua tarefa lá. Presidente, quando o repórter não quer ser desagradável, ele deixa para o final a pergunta que chateia o entrevistado. Mas como o rádio tem o calor que o jornal não tem e tem o tempo que a televisão não tem, dá tempo de o senhor explicar essa questão que envolve o presidente Sarney. É de um outro partido, o senhor não votou nele para senador. Agora, o que eu mais ouço na rua é o seguinte: o presidente Lula, pela história que ele tem, não pode defender Sarney como vinha defendendo, pelo menos até ontem. A pergunta é básica: é a governabilidade que exige essa postura de um chefe de nação, de ser do jeito que o senhor tem sido até agora em relação a todo escândalo envolvendo o nome do presidente do Congresso Nacional?
Presidente: Não. É o meu senso de justiça. Eu não quero para mim, eu não quero para o presidente Sarney, eu não quero para você e para nenhum brasileiro o julgamento precipitado, sem que haja as investigações corretas. O que garante para nós a lisura das apurações e a lisura de um julgamento justo é a investigação ser correta.
O presidente Sarney está sendo acusado de muitas coisas, ou seja, de ato secreto, de contratação de pessoas. E dá a impressão que é apenas o presidente Sarney, dá a impressão que isso é uma coisa que começou ontem. Isso é uma coisa histórica no Senado brasileiro. O presidente Sarney já pediu para a Polícia Federal investigar o seu filho, e vai ser investigado. O presidente Sarney já pediu para investigar o seu neto, e vai ser investigado. A Fundação Getúlio Vargas está, a convite do presidente Sarney, fazendo um projeto de reestruturação administrativa para o Senado. Ele já suspendeu todos os atos secretos. E eu acho que nós temos que apenas ter a paciência de fazer com que as investigações sejam corretas, se apure tudo o que tiver que apurar. Depois que se apurar tudo, então se faça o julgamento.
O que nós precisamos acabar – e é essa a minha contrariedade – é que no Brasil se construiu o hábito de querer julgar as pessoas antes de as pessoas cometerem um crime. Eu vou lhe dar um exemplo: recentemente, dois ministros importantes meus tiveram acusações. Eles dois pediram afastamento. Já faz três anos e até hoje esse processo não andou. Então, você corre o risco de punir uma pessoa ad eternum, sem que haja uma apuração correta.
O que eu acho? Está sendo investigado? Está. O Senado, o Senado tem instrumentos de investigação, tem Comissão de Ética. O Senado já cassou o Antônio Carlos Magalhães, o Senado já cassou o Jader Barbalho, o Senado já cassou o Arruda, o Senado já... O Congresso já cassou o Collor. Então, o que eu acho é o seguinte: em vez de ficar querendo cassar as pessoas por asfixiamento, é muito melhor... As denúncias estão aí? Estão. Tem Ministério Público, tem Polícia Federal, tem Poder Judiciário; Que se investigue corretamente, e depois puna essa pessoa. Porque quem puniu vai ficar satisfeito, porque agiu corretamente, e quem foi punido não vai ficar com raiva, porque teve uma investigação correta.
O que eu não acho é que a gente tenha que fazer o seguinte: “Ah, fulano está sendo denunciado”. Pede demissão, renuncia. Ora, se isso for verdade... Ou seja, os cargos eletivos perderam o valor. Quem foi que elegeu o presidente Sarney presidente do Senado? Os senadores. Somente os senadores é quem têm o direito de encontrar um jeito de fazer a investigação e de afastá-lo, se entenderem que devam afastá-lo.
Jornalista: E é deles que a sociedade, que a opinião pública deve cobrar.
Presidente: E é deles que devem cobrar. É só deles que devem cobrar. Eu só acho que a gente tem que ter paciência, porque o hábito – e você viu o meu discurso no Ministério Público – a minha única preocupação é o seguinte: é que um cidadão que tem o seu nome colocado em uma manchete de jornal de forma equivocada, depois que ele é inocentado não existe espaço para publicar a mesma manchete. Então, o que eu quero apenas é senso de responsabilidade e justiça neste país. Eu não quero para os outros o que eu não quero para mim.
Jornalista: Nesse horário, Presidente, normalmente, na Itatiaia, tem um dos programas de maior audiência, que é o Itatiaia Patrulha, que fala de violência, e as pessoas estão muito ansiosas por mais justiça. Ontem, o diretor da Polícia Federal passou por Belo Horizonte para empossar o superintendente e disse o seguinte: vocês não estão vendo mais aquelas prisões espetaculares porque nós mudamos o jeito, e já não há necessidade de tanto escândalo. Mas a Polícia Federal continua a pleno vapor e está, sim, investigando quem precisa ser investigado. É isso o que o senhor garante? Quer dizer, a Polícia Federal não tem pressão e vai continuar apurando, e quem precisar ir para a cadeia, depois que apurar, se depender do Presidente, vai.
Presidente: Meu caro, você pode perguntar para qualquer membro da Polícia Federal ou qualquer membro do Poder Judiciário. Se nós tivéssemos, 20 anos atrás, construído na Polícia Federal o que nós estamos construindo, investindo na Polícia Federal, contratando mais policiais, investindo em tecnologias de investigação, formando os profissionais corretamente e investigando... Não tem, não tem. Eu duvido, se tiver algum adversário na Polícia Federal, dizer que um dia o presidente Lula tentou interferir para que alguma coisa não fosse julgada. Para mim é o seguinte: só tem um jeito de evitar que as pessoas sejam investigadas, as pessoas têm que andarem corretamente. E quem cometer erro, vai ser investigado, e quem for condenado, tem que ser punido severamente. Essa é a lógica que vai dar ao Brasil a garantia de que não haverá mais impunidade.
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