Num episódio surpreendente da história brasileira, a recessão global poupou os trabalhadores que recebem os salários mais baixos e puniu quem tem mais dinheiro. Em vez de subir como nas crises anteriores, a pobreza diminuiu. Nos últimos seis meses 316 mil pessoas deixaram de ser pobres nas seis maiores regiões metropolitanas do Brasil, a despeito do aumento do desemprego, revela o Instituto de Pesquisa Econômica aplicada (Ipea).
O estudo do órgão mostra um descolamento inédito entre pobreza e desemprego no País. De outubro de 2008 a março de 2009, a taxa de desemprego entre os pobres recuou 2,5%. E o número de desempregados aumentou 16,5%. Márcio Pochmann, presidente do Ipea, explicou que o fenômeno de melhoria social mesmo com desemprego crescente é natural em economias desenvolvidas, como reflexo da eficácia das políticas públicas e do alcance mais eficiente da Previdência Social. "Não é um fenômeno só do Brasil, mas dos países desenvolvidos."
O especialista comparou o comportamento atual dos indicadores de miséria com as demais crises que o País viveu nos últimos 30 anos. No início da década de 80, a desaceleração econômica empobreceu mais de 6,8 milhões de brasileiros, apenas no período entre 1982 e 1983. No final da mesma década, com uma nova recessão, o País teve novamente um rápido crescimento do número de pobres, de mais de 3,8 milhões. A crise asiática, no final da década de 90, elevou o número de miseráveis, em 1,8 milhão.
E por que a pobreza diminuiu desta vez? De um lado, o Bolsa-família, o salário mínimo e previdência social maiores estão combatendo a miséria. "A principal diferença entre o que acontece agora e as crises anteriores é que nunca se teve tanta atenção pública voltada à base da pirâmide social, antes pouco ou quase nada desenvolvida", disse Pochmann. O poder aquisitivo foi mantido, ao contrário das crises anteriores. Durante os quatro períodos de desaceleração econômica considerados nota-se que somente no período atual o valor real do salário mínimo conseguiu guardar seu valor real superior (8%). Entre os anos de 1998 e 1999, o mínimo perdeu 3,1% do seu poder aquisitivo. Na recessão de 1989-90, o valor real caiu 33,6% enquanto 1982 e perda no poder do mínimo foi de 8,2%
Por outro lado, demissões mais concentradas nas empresas exportadoras, que pagam salários mais altos, também explicam o fenômeno de redução da miséria em plena crise. Como a crise atingiu mais fortemente os exportadores, a mão-de-obra destas empresas, mais cara que as demais, foi impactada. De outubro a novembro o desemprego dos pobres aumentou 18,5%. Entre os não pobres, a alta foi de 24,8%.
O Ipea também apurou que a taxa de pobreza recuou 28,1% nos últimos quatro anos. Em março, a miséria - população com menos de meio salário mínimo - alcançava 30,7%, percentual que passava de 42% em 2004.
O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que a diminuição da miséria é mais um sinal de que o País vai bem, obrigado. "O governo não quebrou. Os pobres não estão sendo aqueles que estão pagando pela crise", disse. Quem vinha pagando o preço da desacaleração, segundo Bernardo, era a indústria, mas esse movimento de perda estaria chegando ao fim. "Quando o Lupi (ministro do Trabalho) disse que o mercado de trabalho reagiria, quase foi linxado. Agora vemos que ele tinha razão", acrescentou o ministro.
O especialista Afonso Pastore, que costuma defender posições conservadoras e políticas fiscais mais rigorosas que as praticadas atualmente, admitiu que a crise provocou necessidade de mudanças na maneira de pensar dos economistas. "A crise nos tornou a todos keynesianos", disse.
A pesquisa do Ipea foi feita com base em informações das seis principais regiões metropolitanas do País (Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre) e da Pesquisa de Emprego e Desemprego do IBGE, o estudo destaca os principais elementos que podem estar contribuindo para que a pobreza persiga, pelo menos até o momento, trajetória distinta da verificada em outras circunstâncias de crise econômica.
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