De tudo o que se tem publicado sobre as negociações envolvendo a consolidação das operadoras de telefonia Oi, ex-Telemar, e Brasil Telecom, conhecida também por BrT, duas questões são verdadeiras. A primeira é que não há improviso nas negociações. Apesar de um ou outro desencontro, comum em operações de vulto e vários interesses envolvidos, tudo tem sido milimetricamente considerado.
A segunda é que a modelagem da operação segue um script aprovado previamente pelo próprio Presidente Lula e pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, desde o momento em que ficou claro que ou as duas únicas operadoras brasileiras com capital nacional em seu grupo de controle se uniam ou o setor de telecomunicações seria de cabo a rabo desnacionalizado sem dó. A preferência do governo por este desfecho, porém, é só indicativa, uma preferência, sem nenhum envolvimento nas negociações, e não havia como ser diferente.
Oi e BrT são empresas privadas, embora o BNDES tenha uma posição acionária na primeira e fundos de pensão de instituições estatais, sobretudo a Previ, sejam sócios de ambas. A comunhão de interesses de tais capitais, porém, trabalha a favor do entendimento, que vai da intenção de alguns sócios privados de liquidar seu investimento ou na Oi ou na BrT — e só isso já tornaria necessário um rearranjo societário nas duas —, ao desejo de outros de aumentar ao que for preciso sua participação dentro de um novo acordo de acionistas.
As mudanças foram precipitadas pela entrada na área da ex-estatal de telefonia do México Telmex, privatizada pelo empresário Carlos Slim, que se ligou ao Brasil com ambição ao ritmo de banda larga. Slim comprou a Embratel, criou a Claro, assumiu a Net e estendeu o olhar cobiçoso para Oi e BrT. Os passos da espanhola Telefónica, outro gigante, também mostraram ritmo alucinante, culminando com a compra, na Europa, de uma fatia expressiva do capital da Telecom Itália, sócia no Brasil da BrT e dona da TIM.
Essa fatia da BrT foi comprada dos italianos, após sua associação com os espanhóis, pelo seu grupo de controle remanescente, formado pela empresa de investimentos do Citibank e pelos fundos de pensão liderados pela Previ. Sobraram outras pendências na complexa rede acionária da Oi e BrT que as atuais negociações poderão resolver, além de pô-las a salvo de ações especulativas que rodeiam o setor.
Lances invasivos
Se no Brasil há um processo de consolidação do capital das teles, em nível global os lances são até mais invasivos. Fundos de hedge globais tomaram posições-chaves importantes no capital de muitas delas e viraram peças decisivas — se não do controle, de decisões estratégicas tais como mudanças societárias e novos investimentos. Atribuiu-se a tal movimento o fracasso das tentativas da Oi para pulverizar suas ações no mercado. Fundos de hedge estão nela, com ações sem voto, e na BrT. Mas também na Portugal Telecom, PT, que divide no Brasil com a Telefónica o controle da Vivo. Na PT também aparece com uma posição minoritária o ubíquo empresário Slim.
Em meio a esta maçaroca de participações acionárias na telefonia, a GP, que integra o grupo de controle da Oi com a La Fonte, dona da rede de shoppings Iguatemi, e a empreiteira Andrade Gutierrez, precisa desfazer-se dessa sua participação. A GP está na Oi desde a sua privatização por meio de um dos fundos criados com recursos captados normalmente no exterior para aplicação em ativos no país. Tais fundos têm prazo de vencimento, e o da Oi já venceu.
Na BrT, depois de superado o imbróglio entre o Banco Opportunity, de Daniel Dantas, até então o administrador da parcela do Citi na empresa, e fundos de pensão, ficou um vazio. O Citi entrou na BrT apenas como investidor e, dada a crise financeira nos EUA, sair o quanto antes se tornou dramático. GP e Citi, por razões diversas, forçam as mudanças na Oi e BrT que se trata agora de acomodar.
Negócios de ponta
O que rola como mais provável é a compra do naco da GP na Oi pela AG e La Fonte, consolidando o controle da operadora com BNDES. Num movimento paralelo, Oi compraria a parte do Citi na BrT. Em acordo com os fundos, então, haveria a redistribuição das participações, desaparecendo a BrT, absorvida pela Oi. Se tudo funcionar, a nova tele, revigorada, impulsionaria também a tecnologia de informações no país, auxiliando o BNDES na criação de negócios de ponta.
As circunstâncias colocam o país diante de uma oportunidade única de recuperar o tempo perdido para revigorar a tecnologia nacional num setor estratégico para o desenvolvimento econômico e social, e isso sem estatização, aumento da presença paraestatal no setor e o sempre questionável recurso de subsidiar negócios privados.
Tudo foi projetado para envolver apenas riscos e custos privados, além de dar saída para um problema de difícil solução e que já se faz presente: a sustentabilidade do modelo de negócio da telefonia fixa num ambiente dominado pela comunicação sem fio. Tal cenário é mais grave para a BrT, que ao contrário da Oi extrai a maior parte de seu resultado do que está virando passado no mundo wireless.
Ainda que faltassem tais considerações, do ponto de vista apenas econômico é mais viável supor o acirramento da concorrência se no setor emergir uma forte empresa privada nacional. Além de dar nexo à inovação tecnológica criada nas universidades e incubadeiras de novos negócios, instigará as multinacionais a não olhar o país tão só como um mercado, mas também como centro de desenvolvimento.
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