Por uma coincidência amarga, Geraldo Alckmin havia programado para ontem - dia do aniversário de São Paulo - o início de sua jornada de cinco meses em Harvard. A metrópole que o tucano deixa viveu um estranho feriado, em que o noticiário sobre as habituais pseudo-obras entregues neste dia (ontem foram reinaugurações de praças; há alguns anos, uma fonte luminosa), dividiu atenção com o corpo literalmente estendido no chão, como cantou João Bosco em "De frente pro crime". Até a noite de ontem, o último cadáver ainda não havia sido retirado do buraco que se abriu na linha 4 do metrô.
A discussão sobre a existência ou não de culpa da administração estadual passada no episódio concentra-se, até agora, no modelo do contrato adotado. Não é raro entre engenheiros o conceito de que a modalidade "turn key", usada na obra do metrô, desestimula a fiscalização. É quase certo que as investigações caminhem para isentar, do ponto de vista técnico e jurídico, o ex-governador de alguma responsabilidade, mesmo indireta, sobre a cratera. O contrário será absolutamente surpreendente. O problema para Alckmin será transpor o aval a ser recebido dos investigadores para o eleitorado. Pode-se perguntar como ficará sua imagem de bom gestor, cuidadosamente cultivada na campanha presidencial do ano passado, se o inimigo mostrar o abismo na rua Capri como símbolo de sua administração.
Divergências sobre saldo político do desastre
As avaliações dentro do próprio PSDB divergem. Há os que vêem com preocupação as conseqüências políticas do episódio. Há os que não vêem conseqüência alguma: apostam na capacidade da população de separar responsabilidade ou de achar normal o que aconteceu ou até mesmo até 2010 já tenham esquecido o fato. E assim, citando outra vez o samba, sem pressa cada um iria para o seu lado, pensando numa mulher ou num time. A resposta a esta questão não deve tardar. A princípio, o prefeito Gilberto Kassab (PFL) só receberá o apoio dos tucanos no próximo ano se ganhar popularidade. Caso contrário, Geraldo Alckmin só não será candidato a prefeito de São Paulo se não quiser. A pronta presença de Kassab no cenário da tragédia e a vulnerabilidade a que Alckmin passa a ser exposto pode mudar os dados da equação.
Existem restrições na ala do PSDB ligada ao governador José Serra a respeito de Alckmin assumir a presidência do partido este ano, possibilidade que o manteria no cenário eleitoral de 2010. Sob reserva, comentam que falta consistência para o ex-candidato presidencial revitalizar o partido. Mas em relação à sucessão municipal em 2008, a ala serrista é absolutamente pragmática: o candidato do partido deve ser aquele que possuir, logo no início da corrida eleitoral, maiores condições de manter o governo municipal na esfera tucano-pefelista. Algo parecido com o critério que tentaram fazer valer na disputa pela candidatura presidencial do PSDB em 2006, sem sucesso. Kassab é uma incógnita e Alckmin teve no ano passado 53,8% dos votos paulistanos no primeiro turno e 54,4% na segunda rodada. Serra, para governador, conseguiu um resultado ligeiramente menor: 53,1%. Nos círculos próximos ao governador, a aposta é que o prefeito, um novato em eleições majoritárias, deve aparecer com menos de 10% nas primeiras pesquisas de opinião, e que Alckmin ficaria à frente da ex-prefeita Marta Suplicy (PT). O trunfo do prefeito, além da importância para o PSDB em manter intacta a parceria com o PFL em 2010, está no interesse do governador: ao renunciar à prefeitura depois de prometer não fazê-lo, em março do ano passado, Serra tornou-se um fiador de seu vice. "Um fracasso administrativo em São Paulo nos atingiria de maneira mais profunda que o de Celso Pitta atingiu Paulo Maluf. Pitta foi eleito. Kassab é prefeito por vontade de Serra", afirmou um interlocutor do governador.
Helena
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