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domingo, 30 de maio de 2010

Ao humano em Clovis Rossi

Um comentário sobre a Paella do Lula
(Claudia C. Carezzato)

"Que texto fantástico! A imagem é a do lírio brotando no pântano... de um acidente, surge o humano , não no presidente, mas no jornalista, que por uns instantes parece ter conseguido vislumbrar o ser humano formidável que é o presidente Lula.
É preciso ter olhos humanizados, olhos de ver, para ver o grande homem que a imprensa se esforça para esconder e tirar o brilho. Se hoje a esmagadora maioria dos brasileiros insiste em aprová-lo como o melhor presidente que o Brasil já teve, não é porque fale muitas línguas ou por sua formação acadêmica. Como todos sabemos, inclusive nós que o amamos muito, não negando a lingüística de sua origem, ele continua não acertando os Ss no lugar certo. E apesar de ser isso um motivo para chacotas, como tantos outros, diferenças sociais que fazem tantos tolos diplomados rirem, realmente não tem a menor importância.
É uma pena que esse momento precioso de lucidez e humanidade tenha durado tão pouco, e o pequeno tenha tomado conta do jornalista novamente.
http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com/2010/05/ao-humano-em-clovis-rossi.html

A PAELLA DO LULA
Clovis Rossi
(...)
O presidente Lula havia terminado de discursar, após receber prêmio. Sempre que isso acontece, os jornalistas (e muitos outros no auditório) tentam se aproximar do presidente, para arrancar uma frase ou, simplesmente, mostrar a cara.
Foi o que tentei fazer, mas pela via errada. Em vez de subir pela escadinha que levava ao palco, tentei escalar o degrauzão do meio. Escorreguei, cai de costas e fraturei as costelas.
Ainda assim, me levantei, usei a escadinha mas, ao chegar perto do bolo, estava como Jorge Araujo, um extraordinário fotógrafo da Folha, costuma brincar: "Já vi cadáveres mais corados que você".
Descrição perfeita para meu estado naquele momento. Se não fosse Patrícia Chiarello, misto de diplomata (da assessoria de imprensa do Itamaraty) e anjo-da-guarda de jornalistas, me mandar sentar e tomar água, teria desmaiado no meio do palco.
O presidente Lula se aproximou e constatou o mesmo que o Jorge Araujo: "Você está branco e suando frio".
Não me lembro se foi antes ou depois da frase de Lula que o coronel Cléber Ferreira, médico da Presidência, me examinou. No momento em que apalpou minhas costas, detectou a fratura e iniciou as providências para que eu fosse levado ao hospital.
Tentei resistir, dizendo que precisava terminar os textos do dia e enviá-los para a Folha. Aí, baixou o coronel no médico, e as ordens foram cumpridas.
Ele fez questão de me acompanhar na ambulância e no hospital, enquanto fazia as radiografias e um exame de urina para ver se a queda trouxera outras complicações.
Primeira observação que, imagino, o leitor não desconfia: é possível, sim, a um médico da Presidência abandonar o presidente para dar atenção a um jornalista. É verdade que, naquela altura, o jornalista precisava dele mais que o presidente, mas o gesto fica.
Como ele me contou no caminho, foi só o seu lado coronel que forçou Lula a não viajar para Davos, em janeiro, quando passou mal em Recife.
(...)
Pouco antes da chegada deles, aparecera no meu quarto uma quentinha, enviada pelo presidente Lula.
Eu já havia jantado, no próprio quarto. Por isso, ofereci a paella (o conteúdo da quentinha) aos companheiros. Assis Moreira não se fez de rogado. Comeu toda a paella do presidente.
Aí, chegaram Lula e sua turma. O assessor diplomático Marco Aurélio Garcia, os ministros Nélson Jobim e Franklin Martins, Nelson Breve, também da SECOM, Carlos Villanova, diplomata que é o segundo de Franklin na Comunicação Social da Presidência, em geral encarregado com competência das viagens internacionais de Lula. Talvez houvesse mais alguém com eles, mas eu não tinha condições físicas de girar o corpo para ver quem se postou atrás de mim.
Lula chegou no exato momento em que eu havia iniciado assim o texto: "Sem se manifestar desde que deixou o Irã na segunda-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ontem tempo para "amadurecer as reações" em torno do acordo com os iranianos (e os turcos) antes de se pronunciar".
Ordenei: "Senta aí e escreve o resto, vai. Você sabe melhor do que eu o que você pensa e diz".
Observação final: minha relação com o presidente (e também com o seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso) sempre foi cordial, como pessoas físicas. Como pessoas jurídicas, critiquei um e critico o outro, às vezes impiedosamente, mas esse é o jogo certo (acho eu) entre jornalismo e política.
Com FHC, a relação era mais formal, pela idade de cada um. Com Lula, é mais relaxada, até porque o conheço desde o tempo em que eu é que podia mandar quentinhas para ele, não o contrário.
Tanto que me despedi brincando: "Você é um péssimo presidente, mas um notável ser humano".

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