A imprensa brasileira (PIG) produz besteiras escritas e faladas em abundância, mas poucas vezes vi tamanha fartura de besteiras como o que é dito sobre o suposto relatório da FAB (Força Aérea Brasileira) que teria escolhido o caça sueco Gripen NG no projeto F-X2.
O noticiário apresenta um quadro onde o presidente Lula estaria escolhendo um caça por capricho pessoal, e a FAB estaria contrariando o presidente, com um relatório técnico (que na verdade é um parecer para subsidiar a tomada de decisão).
Chega a ser ridículo esse viés do noticiário. Vamos "desenhar" para a imprensa entender:
Se o presidente quisesse "sacanear" a FAB, como insinua a imprensa, o Gripen sueco seria o melhor presente que a FAB poderia dar ao presidente Lula: simplesmente porque é o mais barato, e sobra mais dinheiro no orçamento da União para programas sociais e outros investimentos em infra-estrutura que renderiam muito mais popularidade do que a compra de 36 caças mais caros.
Se o governo Lula quisesse empurrar goela abaixo da FAB um caça francês, simplesmente já teria feito: em recente acordo Brasil-França adquiriu helicópteros e cinco submarinos, a serem construídos em parceria com empresas e a Marinha brasileiras. A França foi escolhida por permitir que o conhecimento tecnológico seja transferido para a indústria local.
Por que os caças da FAB franceses ficaram de fora desse acordo já fechado? Justamente porque o governo não havia decidido pelos franceses politicamente, como o noticiário prega falsamente, e justamente por ouvir os pareceres técnicos da FAB.
Se a decisão política estivesse tomada, o "pacote" dos submarinos e helicópteros incluiria os caças franceses já naquele momento, e o assunto já estaria encerrado. No fundo, a FAB ficará satisfeita com qualquer escolha, pois todos modelos são bons, e cumprirão as funções de defesa.
O projeto FX vem desde a era FHC. Não foi implantado na época e a seleção ficou obsoleta com o tempo, daí surgiu o FX2. O governo neoliberal demo-tucano deixou o Brasil quebrado, e priorizava apenas os custos, se lixando para tecnologia e indústria nacional. Pelo contrário, cedia à pressões para fazer compras governamentais no exterior. Depois que o governo Lula recuperou as finanças nacionais, criou a Estratégia Nacional de Defesa. Esta política estratégica privilegia a fabricação e tecnologia nacionalizada dos equipamentos para nossas Forças Armadas. É diferente da visão anterior, neoliberal e de encomendas no estrangeiro.
Desde que o plano Estratégia Nacional de Defesa entrou em vigor, no governo Lula, os critérios que mais pesam na decisão da compra dos caças são a transferência de tecnologia, e não apenas o preço (que também é importante, é claro, mas passou a ter um peso menor do que tinha).
A Aeronáutica, em seus institutos militares de pesquisas, tem experiência positiva com a Suécia em cooperação tecnológica. Tem experiência negativa com os EUA e já teve experiência negativa com a própria França. Dentro da FAB há grupos que discordam entre si. Parece que o pessoal envolvido com Pesquisa e Desenvolvimento preferem o desafio de desenvolver conjuntamente o Gripen NG (um projeto em desenvolvimento, ainda). O pessoal de combate se dividem: parte é mais simpática à solução conservadora do modelo estadunidense, por ser mais testado, porém os EUA são os que mais restringem transferência de tecnologia. Parte pendem para o Rafale por considerarem-no mais avançado e desempenhar mais funções em um combate. Outros estrategistas da FAB que pensam em desenvolver um caça de 5a. geração são simpáticos ao Rafale francês, pois consideram sua tecnologia mais avançada do que os outros modelos.
Assim, qualquer decisão agradará mais a uns e menos a outros, dentro da própria FAB, e conforme a decisão tomada, podem ter certeza que os que tiveram a opinião contrária à escolhida serão escalados para dar entrevistas nos canais da Globo, nas páginas da revista Veja e nos jornais Folha e Estadão.
A decisão final será simples e segue a Estratégia Nacional de Defesa: se a proposta dos suecos for melhor em termos de transferência de tecnologia avançada do que da França, eles serão os vencedores. O mesmo vale para a França, desde que o fabricante cumpra o que Sarkosy andou prometendo: baixar o preço e comprometer-se por contrato com transferência de tecnologia. O resto é conversa de botequim dentro de redações.
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