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domingo, 18 de novembro de 2012

Ayres Britto poderia ser condenado se fosse tratado como foi o 'mensalão'?



De quem vocês acham que são estas frases abaixo?
... nessas horas o que eu posso dizer é o seguinte (...) eu tenho uma vida pregressa, eu tenho uma biografia, eu tenho um histórico de vida que é muito conhecido.
1 - ( ) De José Dirceu se defendendo das acusações no chamado "mensalão".
2 - ( ) De um ministro do STF se defendendo de suspeitas sobre seu genro envolvendo seu nome.

Em setembro de 2010, faltavam poucos dias para o julgamento de um recurso do ex-governador Joaquim Roriz no STF, sobre estar inelegível com base na lei da ficha limpa.

Um dos votos no STF era do ministro Ayres Britto, relator do caso e contado como voto contra Roriz.

No dia 3 de setembro de 2010 o advogado Adriano Borges, genro do ex-ministro do STF Ayres Britto (e sócio da filha dele em um escritório de advocacia), teve uma reunião com o ex-governador Joaquim Roriz para tratar de sua contratação para defendê-lo (o processo já estava no fim, há poucos dias do julgamento). A conversa foi filmada e vazou para a imprensa. Conversaram sobre o impedimento do sogro participar do julgamento, eliminando um voto contra.

O vídeo traz forte suspeita de maracutaia, conforme amplamente noticiado na época, levando o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-DF a abrir processo ético, ao genro de Britto renunciar a 11 processos que corriam no STF, e o próprio ex-ministro viu-se obrigado a pedir uma investigação sobre o genro ao Ministério Público, onde o vídeo já havia sido encaminhado por outros.

Porém, o contrato não foi consumado, o genro não defendeu Roriz e Ayres Britto votou contra o ex-governador. Portanto, apesar de tudo o que está registrado no vídeo, não há nenhuma prova irrefutável que justifique incriminar Ayres Britto. Ele tem o benefício da dúvida.

Mais complicado é o caso do ex-senador Expedito Júnior.

A Justiça Eleitoral havia determinado a perda do mandato do ex-senador Expedito Junior por irregularidades eleitorais. Deveria assumir a cadeira no Senado, em seu lugar, Acir Gurgacz. O Senado decidiu esperar o esgotamento de recursos para cumprir a troca. Gurgacz entrou com mandato de segurança no STF em março de 2008 visando fazer a mesa do Senado cumprir a sentença da Justiça Eleitoral.

Com o processo já em curso no STF (MS 27613), Expedito Júnior contratou o genro de Ayres Britto para substituir o antigo advogado e assumir a causa a partir de julho de 2009.

Em outubro de 2009 o mandato foi julgado e Ayres Britto não votou.
MS 27613
Neste caso, ainda que Expedito Júnior tenha perdido a causa, sem o voto de Britto, consumou-se o ingresso do genro na causa para impedir o sogro de votar. Isto é proibido pelo Código de Processo Civil, no parágrafo único do artigo 134:
Dos Impedimentos e da Suspeição
Art. 134. É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário:
...
IV - quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau;
...
Parágrafo único. No caso do no. IV, o impedimento só se verifica quando o advogado já estava exercendo o patrocínio da causa; é, porém, vedado ao advogado pleitear no processo, a fim de criar o impedimento do juiz.
Portanto, neste processo, não era Ayres Britto quem tinha que se considerar impedido. Era seu genro que não poderia ingressar na causa depois do processo já estar aberto no STF.

Em um trecho do vídeo gravado, o genro do ex-ministro fala que cobraria R$ 4,5 milhões pela defesa de Expedito Júnior (1,5 independente do resultado e mais 3 em caso de êxito).

Apesar da filha e netos de Britto serem beneficiários dos polpudos honorários de seu genro, e do quadro suspeito formado, não há provas contra o ex-ministro e ele não responde pelos atos de terceiros.

Mas e se esse quadro geral fosse tratado como no caso do "mensalão"?

A teoria do "domínio do fato" poderia ser aplicada a Britto?

O fato dele deter o poder de voto que criaria dificuldades no processo, e do genro ingressar na causa provocando seu afastamento, não caracterizaria as agora famosas "provas indiciárias que gritam por si"? E não obrigaria Britto a "provar sua inocência"? Afinal não é isso que foi dito e feito no julgamento do "mensalão"?

O agora aposentado Ayres Britto, ao fazer a barba, poderia olhar bem fundo em seus próprios olhos no espelho e se perguntar se ele não teria que condenar a si próprio e seus entes queridos pelos mesmos motivos alegados contra os réus do "mensalão". Ou teria que fazer uma mea-culpa admitindo que deveria absolver os outros pelos mesmos motivos que julga os seus parentes apenas como feitores de "maluquices".

Em tempo: As frases citadas no início e a "maluquice" estão nesta entrevista de Ayres Brito ao portal Ig, em setembro de 2010.