Seria mais uma decisão conveniente aos políticos, no momento certo: na noite da última quarta-feira, o Senado aprovou a emenda constitucional que aumenta o número de vereadores, de 51.924 para 59.267, ou seja, 7.343 cadeiras a mais, com a supressão de um artigo incluído na Câmara dos Deputados que obrigava a redução das despesas com os legislativos municipais - o que resultaria em redução dos proventos dos vereadores. "A maioria quer mais vereadores para apoiar. Distorções podem ser ajustadas", explicou candidamente o líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp (RO).
Se a novela terminasse assim, esses vereadores adicionais estariam tomando posse junto com os demais no dia 1º de janeiro. Não terminou, todavia. No dia seguinte, a mesa da Câmara dos Deputados recusou-se a promulgar a proposta, sob o entendimento correto de que as modificações feitas pelo Senado à matéria desfiguraram o texto produzido pela Câmara, e portanto precisaria ser novamente votada pelos deputados. Se em 2009 esse assunto vingar, somente na próxima legislatura, que se inicia em 2013, as Câmaras de Vereadores incharão com as cadeiras a mais introduzidas pelo legislativo federal.
O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), em campanha pela reeleição, entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com um mandado de segurança contra a decisão da Câmara. Mas, assim como é juridicamente questionável a sua postulação de ser o presidente do Senado por dois mandatos sucessivos, vai gastar à-toa o tempo dos nobres ministros do Supremo com o mandado de segurança. O Senado suprimiu, da proposta de emenda constitucional que veio da Câmara, todo um artigo que restringia os gastos das municipalidades com o Poder Legislativo. Segundo o artigo aprovado pelos deputados, os municípios com arrecadação de até R$ 30 milhões anuais poderiam gastar com suas Câmaras de Vereadores até 4,5% de sua receita; os com arrecadação entre R$ 30 milhões a R$ 70 milhões, até 3,75%; de R$ 70 milhões a RS%$ 120 milhões, 3,5%; de R$ 120 milhões a R$ 200 milhões, 2,75%; e acima de R$ 200 milhões anuais, até 2%. Com o sumiço do artigo, que teoricamente faria o número de vereadores voltar ao que era antes da resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de 2004, mas reduziria os gastos com as Câmaras, os municípios voltariam à situação de antes: muitos vereadores e muitos gastos. Essa é uma alteração de fundo na proposta apresentada pela Câmara. O Senado não fez uma mudança apenas cosmética. A mesa da Câmara agiu corretamente ao recusar-se a promulgar a emenda constitucional.
A Câmara dos Deputados, em 2009, terá uma boa oportunidade de, aproveitando a incorreção na tramitação da proposta, reavaliar o seu mérito. A crise de representação do Legislativo brasileiro não tem relação com o número de representantes. A atenção de qualquer político minimamente preocupado com a qualidade da representação deve voltar-se para dentro dos partidos, que têm a obrigação de estabelecer vínculos mais orgânicos com aqueles que usam da legenda para obter um cargo eletivo; cobrar compromissos programáticos e ideológicos dos eleitos; manter comissões de ética atuantes, que permitam depurar seus quadros daqueles que se utilizam de cargos públicos para conseguir vantagens privadas. A atenção à qualidade do político que será oferecido ao leitor, no período eleitoral, é o essencial. Também é da alçada de políticos e partidos a preocupação com os gastos da municipalidade com o Poder Legislativo. O orçamento municipal tem que fazer frente às necessidades básicas dos cidadãos. As Câmaras Municipais não podem ser um peso, e sim o fórum para decisões democráticas e garantias de direitos.
O aumento do número de vereadores, que volta à pauta com uma insistência ausente em assuntos de maior importância, leva o país a recear das intenções dos parlamentares, quando se fala em reforma política. O tema, que é colocado na agenda como um instrumento para modernizar as instituições políticas brasileiras, traz de contrabando tantas intenções ruins que se torna difícil não temê-lo.
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