O secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, precisou dar muitas explicações aos deputados da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) sobre a conveniência da entrada da Venezuela no Mercosul. Em audiência pública de mais de três horas, o questionamento ao presidente Hugo Chávez e à democracia venezuelana dominaram o debate.
Guimarães descreveu uma Venezuela com democracia plena. "Existe ampla liberdade de imprensa. O grau de liberdade é extraordinário. A violência dos ataques ao governo por parte da imprensa é muito grande", disse Guimarães. "Ninguém foi preso por questão política. O Congresso continua funcionando. As eleições foram acompanhadas por mil observadores internacionais e não houve denúncias", completou.
Segundo Samuel Guimarães, em respeito aos princípios da não-intervenção e da autodeterminação dos povos, "não cabe ao Brasil e nem ao governo brasileiro julgar a conveniência das formas de organização dos Estados sobre as políticas de governo".
O professor Carlos Roberto Pio, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), participou do debate. O acadêmico adotou discurso oposto. "Não cabe ao Brasil opinar sobre as políticas de governo, mas cabe ao país julgar a conveniência de aliados. Os dois princípios fundamentais (não intervenção e autodeterminação dos povos) devem ser o guia para a avaliação da entrada da Venezuela no Mercosul", disse o professor. Para ele, a Venezuela descumpre o princípio da autodeterminação quando financia movimentos bolivarianos em outros países, como na Argentina, ou quando repassa recursos para financiamento de projetos que não são aprovados pelo governo da Bolívia. Para Roberto Pio, o episódio no qual Chávez se desentendeu com o rei Juan Carlos, da Espanha, há uma semana, é emblemático. "A discussão entre Chávez e o rei mostra as dificuldades de convivência política que o país pode ter com uma parceira como a Venezuela", afirmou.
O professor afirmou que, a curto prazo, o Brasil poderá ter benefícios com o novo parceiro, mas prevê um futuro temeroso. "No curto prazo, poderá haver ganho para alguns setores empresariais, porém, um crescente risco de violação dos contratos existe e poderá trazer prejuízos", disse. Hoje, a CCJ deverá votar o relatório elaborado pelo deputado Paulo Maluf (PP-SP) sobre o tema. O parlamentar fez duras críticas ao presidente Chávez, mas orientou a comissão a votar favoravelmente à adesão do país. Ontem, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, voltou a defender a entrada do novo parceiro no Mercosul.
Mais cedo, depois da cerimônia de lançamento da Agenda Social Quilombola, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, também defendeu a entrada da Venezuela no Mercosul. Amorim rebateu as críticas sobre falta de democracia no país governado por Hugo Chávez. "Na verdade, na Venezuela tem havido permanentemente eleição. O Brasil mesmo criou um grupo em meio à crise na Venezuela e se esforçou não só para que houvesse o referendo previsto na Constituição como encorajou o presidente Chávez a fazer isso e depois houve outras eleições, sempre com observadores internacionais. E foram eleições limpas", disse Amorim.
O ministro afirmou que os próprios opositores do presidente Chávez reconhecem que não há pressão no país nem presos políticos na Venezuela. "Agora sistemas políticos cada um resolve da maneira que quiser resolver. No Brasil nós temos o princípio da alternância do poder, que continuamos a respeitar. A democracia assume várias facetas. Muitos países que são tidos como democracia tiveram um governo que ficou muito tempo no poder e tiveram outras práticas que nós também não concordamos", disse o chanceler brasileiro, que acrescentou que a entrada da Venezuela será boa também para o Brasil e para o próprio bloco econômico.
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