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sexta-feira, 6 de outubro de 2006

ENTREVISTA – MICHEL LÖWY


Sociólogo brasileiro, radicado na França avalia que a alternativa do PSDB consegue ser mais nefasta para a América Latina e para os movimentos sociais.

Gilberto Maringoni – Carta Maior


SÃO PAULO – O sociólogo Michel Löwy é possivelmente o intelectual brasileiro de maior prestígio internacional. Residindo na França há mais de quatro décadas, Löwy é diretor do Centre National de la Recherche Scientifique, em Paris. Suas pesquisas foram materializadas em extensa obra, publicada em 22 países, na qual se destacam os livros ‘Romantismo e messianismo’, ‘Marxismo e teologia da libertação’, ‘Ideologias e ciência social’, dentre outros.

Löwy vem constantemente ao Brasil e acompanha em detalhe a política nacional. Sua avaliação do governo Lula é muito dura. "Predominou o continuismo, a orientação liberal, favorável aos bancos, ao capital financeiro nacional e internacional", diz ele, que apoiou a candidatura de Heloísa Helena à presidência. Diante das opções colocadas para o segundo turno, no entanto, o sociólogo é direto: "é importante evitar que chegue ao poder um personagem perigoso, identificado com a Opus Dei, e com a versâo mais brutal, repressiva e antipopular do capitalismo selvagem".

Nesta entrevista, concedida por correio eletrônico, este filho de imigrantes judeus, nascido em São Paulo, em 1938, explica porque votará em Lula no segundo turno.

CM - O sr. assinou um manifesto de apoia à candidatura de Heloísa Helena no primeiro turno. Como viu o resultado das eleições presidenciais no Brasil?
ML - Acho muito importante o resultado obtido por Heloisa Helena. O fato de quase 7% dos eleitores terem votado por uma candidata claramente identificada com os interesses dos explorados, com um programa de ruptura com o neoliberalismo, com uma perspectiva socialista e democrática, que retoma as melhores tradições do PT (antes de sua conversão ao social-liberalismo), é um grande avanço para a reconstrução da esquerda no Brasil. Heloísa Helena conseguiu empolgar os corações de mais de seis milhões de brasileiros e isto é um grande passo na caminhada para um outro futuro.

CM - O sr. tem criticado publicamente o governo Lula. Como o sr. o avalia?
ML – O balanço é globalmente negativo. Muito decepcionante. Nada a ver com o que havia sido o programa, a prática e a trajetória do PT nos primeiros 15 anos de sua história. Certo, uma ou outra medida de assistência aos pobres foi cumprida e os movimentos sociais deixaram de ser criminalizados. Mas no essencial, isto é, na política econômica, predominou o continuísmo, a orientação liberal, favorável aos bancos, ao capital financeiro nacional e internacional. A reforma agrária ficou muito aquém das promessas. O governo destinou 10% das verbas agrícolas para a agricultura familiar e os outros 90% para o agronegócio de exportação. Isto mostra bem quais são suas prioridades socioeconômicas. Sem falar dos escândalos, da corrupção e dos "sanguessugas"…

CM - Agora, no segundo turno, as opções colocadas são Lula e Geraldo Alckmin. Há diferenças entre eles?
ML - Acho que existem diferenças, sim. São duas variantes da política liberal, mas mesmo assim não são equivalentes. Um governo Alckmin seria catastrófico para os trabalhadores brasileiros. Seria um governo reacionário, que buscará a privatização do pouco que resta de empresas nacionais, como a Petrobras, e dos serviços públicos, e investirá na repressão aos movimentos sociais. Lula foi uma grande decepção, mas Alckmin é sem dúvida muito pior do que Lula, do ponto de vista dos pobres e dos oprimidos.

CM - Alguma coisa muda no cenário inernacional estando Lula ou Alckmin na presidência do Brasil?
ML - O governo Lula nunca teve a coragem de enfrentar os Estados Unidos, de romper as negociaçôes da Alca, de apoiar os processos antiimperialistas na América Latina, como os da Venezuela e da Bolívia. Mas um governo Alckmin seria completamente alinhado com a política norte-americana, como mais um pião no jogo imperialista em nosso continente.

CM - Se estivesse no Brasil, o sr. apontaria o voto em algum dos dois? Haveria alguma pré-condição para isso?
ML - Pelas razões anteriormente expostas, e para evitar o retrocesso que seria um governo Alckmin, vou votar em Lula no segundo turno. Como brasileiro no exterior tenho o direito de votar aqui na Embaixada do Brasil em Paris. Sem ilusões, mas convencido de que é importante evitar que chegue ao poder um personagem perigoso, identificado com a Opus Dei, e com a versão mais brutal, repressiva e antipopular do capitalismo selvagem. Se trata de minha opção pessoal, não falo em nome de nenhum partido ou corrente política.

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