O Sabesprev, fundo de pensão dos funcionários da Sabesp, a empresa de saneamento básico do Estado de São Paulo, não tem dinheiro para garantir a aposentadoria de seus mais de 20 mil assistidos, ativos e inativos. Mais exatamente, faltam R$ 530 milhões para que a fundação garanta a complementação de renda até a morte do último dos participantes, como diz a lei.
Aquele é o valor do déficit atuarial e equivale a quase metade do patrimônio líquido de R$ 1,1 bilhão do fundo. O problema não é de hoje, mas nunca houve consenso entre a patrocinadora e os participantes para equacioná-lo.
Oito anos atrás, eram R$ 16 milhões de déficit, que só cresceu até este ano quando a Secretaria de Previdência Complementar (SPC), que fiscaliza as fundações, ameaçou intervir caso não se encontre uma fórmula de equacionamento. No documento enviado à Sabesp e à Sabesprev, ao qual o Valor teve acesso através de entidades ligadas aos funcionários, a SPC diz, em outras palavras, que se nada for feito, a projeção é que o déficit atinja R$ 1 bilhão nos próximos cinco anos.
Cumprindo a determinação da SPC, a Sabesp enviou em 29 de setembro uma proposta para chegar ao equilíbrio atuarial. O presidente do Sabesprev, José Sylvio Xavier, disse que não pode divulgar a proposta antes que ela seja aprovada pela SPC, o que é esperado para o fim deste mês. Questionado, o presidente da SPC, Ricardo Pena Pinheiro, disse que não poderia comentar a proposta que está ainda em análise.
Fontes ligadas aos funcionários e que tiveram acesso à proposta, dizem que basicamente o déficit será dividido entre 48,1% para a patrocinadora e 51,9% para os participantes. Estes percentuais correspondem à contribuição de cada parte que é 2,1% para a empresa (em média sobre a folha de pagamentos) e 2,22% para os empregados.
Será oferecida aos participantes a migração dos atuais planos de Benefício Definido (BD) para outros de Contribuição Definida (CD). No novo plano, a patrocinadora manterá sua contribuição, porém os empregados perderão benefícios como reajuste anual, 13º salário, a garantia de renda vitalícia para o participante e a esposa e o seguro de vida e acidentes pessoais que dá cobertura em caso de morte e invalidez.
Os empregados terão um acréscimo de desconto e os aposentados, que não pagavam nada, passam a pagar. Os valores das novas contribuições ainda não foram divulgados.
Os ajustes não vão parar por aí. Além de estimular a migração para o CD, a Sabesprev está preparando uma revisão da meta atuarial, dos atuais 6% ao ano mais a variação da inflação medida pelo INPC, para algo entre 5% e 5,5%. A medida, que vai custar cerca de R$ 300 milhões, está sendo tomada também por outros fundos de pensão e responde à queda da taxa de juros, que tornou inviável o cumprimento das metas.
Nove entidades ligadas aos funcionários e aposentados da Sabesp formaram um Fórum para tentar negociar uma saída para o problema. Elas já tiveram reuniões com o presidente da empresa, Gesner de Oliveira, e levaram suas reivindicações. Mas até agora não tiveram resposta, afirmou Marcos Sergio Duarte, presidente do Sindicato dos Urbanitários da Baixada Santista, Litoral Sul e Vale do Ribeira.
Na lista de reivindicações, os representantes do Fórum de Entidades incluíram a demanda de que a Sabesp assuma o passivo integralmente; paridade na elevação da contribuição, independente da faixa salarial; e a inclusão de benefícios de risco e renda vitalícia também nos novos planos.
Consultada pela reportagem do Valor, a direção da Sabesp não quis dar entrevista. Mas respondeu, por escrito, através da assessoria de imprensa, que "de acordo com a Resolução CGPC (Conselho de Gestão da Previdência Complementar) número 26, de 29/9/2008" cabe a ela arcar com o equacionamento de 48,1% do déficit. Com isso deixa claro que não aceita a proposta de arcar com todo o prejuízo, e confirmou, ainda, a criação do CD, "como forma de evitar a formação de novos déficits no futuro".
O único ponto em que aparentemente há consenso entre as partes envolvidas é sobre as causas do déficit. "Esse plano foi mal formulado", disse o diretor de Assuntos Previdenciários da Associação dos Aposentados e Pensionistas da Sabesp (AAPS), Armando Silva Filho, repetindo o que, segundo ele, ouviu da própria direção da SPC.
O plano Sabesprev começou em 1991 com contribuição paritária de 1,5%, tanto da patrocinadora quanto dos funcionários. Segundo Marcos Duarte, na época a empresa se propôs a incluir os empregados desde 1971, o chamado "serviço passado", pagando a diferença necessária para equilibrar as contribuições aos benefícios futuros.
"Na época, a Sabesp deveria ter acrescentado 0,7% à sua contribuição (que ficaria então em 2,2%) para cobrir o serviço passado, mas isso não se concretizou", diz Duarte. Em 2001, quando o regime de previdência complementar foi regulamentado e os fundos de pensão foram obrigados a se ajustar, a empresa elevou a contribuição para 2,1%. Hoje se vê que não foi suficiente.
"A culpa (do desequilíbrio) não é nossa, é da Sabesp que engessou a contribuição dela em 2%, que é pouco", disse Armando Silva Filho, da AAPS, para quem houve "negligência e omissão" da diretoria da Sabesp e da Sabesprev. José Sylvio Xavier, presidente do Sabesprev, tem outra explicação: "O que aconteceu é que a expectativa de vida dos nossos participantes aumentou sete anos desde 1991 quando o plano foi montado".
Segundo Silva a proposta de saneamento do fundo de pensão é "muito ruim", principalmente para os aposentados. "O plano novo acaba com todos os benefícios e vira praticamente um fundo de investimentos. O risco passa a ser totalmente dos participantes. É muito preocupante", disse. Segundo ele, o Fórum de Entidades pretende entrar na Justiça para obrigar a Sabesp e o governo do Estado a cobrirem o déficit. -Valor Econômico
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