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sábado, 20 de setembro de 2008

Limites da liberdade de expressão segundo o Juiz de Sanctis

O PIC (partido da imprensa corrupta), está dando um xilique por causa da lei prevendo a possibilidade de punição criminal ao jornalista que divulgar escutas telefônicas ilegais (ou legais sob segredo de Justiça). Veja bem que a lei prevê a possibilidade, portanto seria analisado caso a caso.

Pois o Juiz Fausto De Sanctis mostrou que a legislação atual já prevê punição e pensa na mesma direção que o governo Lula sobre o assunto: liberdade de expressão é uma coisa, associação ao crime é outra.

Vale a pena ler uma parte da determinação de prisão na operação Satiagraha, feita pelo Juiz Fausto De Sanctis, tratando do assunto.

Entre tantos argumentos, usa aquele velho conhecido de todo mundo: os direitos de cada um vão até o limite que não avance sobre os direitos dos outros.

No capítulo 7 trata do caso da jornalista Andrea Michael com maestria, mostrando os limites da liberdade de expressão, inclusive dentro das leis atuais. Segue a íntegra:

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL

7. VAZAMENTO DE INFORMAÇÕES SIGILOSAS

Por meio das Representações Policiais, noticia-se que as atividades dos envolvidos voltar-se-iam ao cometimento de delitos de quadrilha ou bando, contra o Sistema Financeiro Nacional, contra o mercado de capitais, de tráfico de influência e eventualmente de "lavagem" de valores, com o auxílio de alguns representantes dos meios de comunicação para veicularem informações com o objeto de distorcer a realidade e franquear resultados favoráveis a seus interesses. No entendimento da autoridade policial, haveria clara infringência aos dispositivos constitucionais estabelecidos nos artigos 220 e 221, inciso IV, ambos da Carta Constitucional.


Para tanto, elencam algumas publicações e procedem ao cruzamento de dados à luz das investigações ora em andamento, apontando indícios de remuneração, direta ou indireta, a jornalistas com recursos de Daniel Valente Dantas ou de seus eventuais colaboradores. As informações retratadas nas Representações Policiais, se de um lado prestam-se, nesta fase
das investigações, a tentar delinear o possível modus operandi utilizado pelos investigados, de outro, não podem e não devem ser interpretadas isoladamente, dada a inviabilidade, no âmbito deste procedimento criminal, de tentar contextualizar as notícias veiculadas pela imprensa com os crimes que se pretende apurar, sob pena de se proceder à extremada e inoportuna conclusão em detrimento da liberdade de expressão.


É intuitivo, porém, ser esta liberdade objeto de tutela constitucional somente enquanto expressão da verdade, já que, nas palavras de Konrad Hesse, "a informação falsa não seria protegida pela Constituição, porque conduziria a uma pseudo-operação da formação da opinião" 8 . A despeito disso, a expressão do pensamento dos jornalistas, articulistas e outros nas matérias referidas pela autoridade policial, não deve ser objeto de perquirição.


Todavia, o teor do artigo publicado em jornal de grande circulação em 26.04.2008 (primeira publicação sobre a existência de procedimento judicial sigiloso), subscrito pela jornalista Andrea Luiza Miranda Michael Ferreira de Mello (que assina Andrea Michael), no qual foram divulgadas questões pertinentes às investigações que se processam neste Juízo, sob segredo, não estaria acobertado pela legítima liberdade de expressão.


A publicação açodada da matéria jornalística prejudicou abrupta e sensivelmente os trabalhos de inteligência desenvolvidos pela autoridade policial, cujas medidas eram acompanhadas pelo Ministério Público Federal e submetidas à apreciação do Poder Judiciário e, por certo, reduzirá a eficácia de medidas assecuratórias da investigação.


A partir daquele momento, Daniel Valente Dantas e Verônica Valente Dantas, por seus procuradores, pleitearam a todas as Varas Criminais desta Subseção Judiciária de São Paulo certidões onde constassem eventuais procedimentos criminais instaurados em seu desfavor envolvendo a notícia, cuja existência - se comprovada - seria de feitos sabidamente sigilosos e, por certo, óbice intransponível haveria a que as autoridades judiciais acolhessem o pleito, já que a notícia jornalística dava conta de procedimento de interceptação telefônica em curso, cuja divulgação irregular configura prática delitiva (artigo 10 da Lei n.º 9.296, de 24.07.1996), porquanto "constitui crime realizar interceptação de comuicações telefônicas de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei". Sem prejuízo, interpuseram seguidas ordens de habeas corpus perante a 2ª Turma do Eg. Tribunal Regional Federal da 3ª Região e as Cortes Superiores. Elegem-se alguns áudios captados recentemente os quais evidenciariam os mecanismos urdidos pelos investigados na tentativa de êxito em seu mister, ou seja, dirigir-se ao Juízo da 6ª Vara e aos Tribunais Superiores para fulminar o feito sigiloso, de que teriam notícia por meio da jornalista Andréa Michel, dentre eles:


(...) A jornalista Andrea Michael não somente divulgou assunto sabidamente sigiloso, conforme aduzido acima, mas ainda teria mantido contato com os interessados, os "alvos" da investigação policial, quando é certo que ao ter ciência dos fatos deveria, s.m.j., tê-los prontamente levado
ao conhecimento do Poder Judiciário, ou do Ministério Público Federal ou mesmo do Departamento de Polícia Federal para apuração do vazamento.


Por esta razão, o vazamento de informações em decorrência do aludido artigo publicado em jornal de grande circulação é questão que demanda pronta investigação para verificação de onde este partiu, jamais para coibir legítima atividade jornalista de prestação de serviço público relevante.


Sendo assim, a jornalista citada, ao tornar público o que deveria ser sigiloso, teria violado normas e princípios legais ao divulgar, sem a devida autorização, fatos gravados pelo sigilo, do que decorre embaraço às investigações pelas autoridades competentes.


Não se pode alegar que sua atitude estaria abrigada nos artigos 5°, incisos IX e XIV, e 220, § 1°, da Constituição Federal (direito à livre manifestação do pensamento, de informar e ser informado, de informação jornalística), uma vez que, como se sabe, as garantias fundamentais,
insculpidas no artigo 5° e também dispersas em vários dispositivos da Constituição Federal, não possuem caráter absoluto, devendo o intérprete fazer o cotejo das normas, a fim de se possibilitar concluir pela predominância de uma ou outra num determinado caso concreto.


A respeito do tema, os constitucionalistas Vidal Serrano Nunes Junior e Luiz Alberto David Araújo escrevem que:


"os direitos fundamentais não são absolutos. Isso quer dizer que, por vezes, dois direitos fundamentais podem chocar-se, hipóteses em que o exercício de um implicará a invasão do âmbito de proteção do outro. É o que, vezes a fio, ocorre entre o direito de informação e o de privacidade, ou entre o direito de opinião e o direito à honra. Nestes casos, a convivência dos direitos em colisão exige um regime de cedência recíproca" (in Curso de Direito Constitucional, São Paulo, Saraiva, 7ª ed, 2003, p.89) ( grifo nosso).


No caso em questão, os valores constitucionais mencionados (direito à informação jornalística e à manifestação do pensamento) estão protegidos por legislação infraconstitucional, ou seja, o Código Penal, artigos 138 a 145, e pela Lei n° 5.250, de 09 de fevereiro de 1967 (Lei de Imprensa). Esta última, apesar de garantir em seu artigo 1° a livre manifestação do pensamento e de divulgação de informações ou idéias 9, deixa claro que tais garantias não possuem caráter absoluto, e as restringe em seu próprio texto, cujo artigo 12, in verbis, prevê que:


"Art. 12. Aqueles que, através dos meios de informação e
divulgação, praticarem abusos no exercício da liberdade de
manifestação do pensamento e informação
ficarão sujeitos às
penas desta lei e responderão pelos prejuízos que causarem"

(grifo nosso).


E, ainda, o artigo 27, inciso VI:


"Art. 27. Não constituem abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e de informação:

VI - a divulgação, a discussão e crítica de atos e decisões do Poder Executivo e seus agentes, desde que não se trate de matéria de
natureza reservada ou sigilosa
"
(grifo nosso).


Outrossim, resta claro que as garantias constitucionais da livre manifestação do pensamento e da informação jornalística possuem limites, que devem ser verificados em cada caso concreto. E, no caso presente, o exercício daqueles direitos sucumbe frente ao poder-dever do Estado de apurar
os ilícitos penais a ele apresentados, fator que justifica a sigilosidade dos procedimentos e rechaça a forma abusiva com que aquelas garantias foram exercidas, infringindo a lei, com burla ao sigilo.


Por outro lado, e como conseqüência dos fatos acima apontados, há, ao menos em tese, sérios indícios de cometimento de crime, à luz do previsto no artigo 153, § 1°, "A", do Código Penal:


" Art. 153(...)

§ 1°- A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública: Pena: detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 2° - Quando resultar prejuízo para a Administração Pública, a ação penal será incondicionada".


Portanto, a Representação da autoridade policial nestes autos relata a divulgação de fatos objetos de procedimento sigiloso que, de acordo com o artigo 8º da Lei n.º 9.296/1996, deve ser preservado, sob pena de infração ao artigo 10 da referida lei.


As medidas até agora adotadas não lograram êxito em identificar a fonte das informações que foram repassadas à jornalista, contudo, pode-se desde já afiançar, mais uma vez, que em razão de sua atuação, muitas das medidas a serem tomadas terão eficácia limitada ou reduzida.


Doutro lado, há que se deixar assentado que não se pretende coarctar a legítima publicação jornalística, mas a ética profissional exige que informações policiais sigilosas que possam comprometer o resultado de práticas estatais legítimas, ainda que levianamente repassadas a setores da mídia, devem ser mantidas sob reserva.


Entendo não ser, todavia, adequado o pedido de prisão temporária (autoridade policial), bem como de Busca e Apreensão em seu domicílio (autoridade policial e Ministério Público Federal).

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8 Apud.Gilmar Ferreira Mendes (in Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p.36 1).

9 Os artigos 12 e 27, VI, não foram suspensos pela decisão do Plenário do S.T.F., por maioria, de 27.02.2008, na qual se decidiu pela suspensão de processos ou dos efeitos de decisões judiciais em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.

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