Há uma possibilidade de que a pior fase da inflação neste ano tenha ficado para trás. Depois das altas fortes de maio e junho, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve ter elevações mais moderadas. Os preços de alimentos não tendem a aumentar com a mesma intensidade e a esperada desaceleração da economia deve reduzir pressões de demanda. Ainda muito influenciado pela alta de 2,11% dos produtos alimentícios, o IPCA de junho mostrou alguns sinais positivos, embora a variação de 0,74% ainda seja salgada.
Os aumentos se mostraram um pouco menos disseminados do que em maio. Além disso, as cotações de serviços e o núcleo que exclui alimentos e preços administrados perderam algum fôlego. Mesmo com essas boas notícias, os analistas mantêm a cautela, devido às incertezas quanto ao rumo das commodities e ao risco de repasses das expressivas altas do atacado para o varejo. A possibilidade de que o IPCA supere o teto da meta perseguida pelo Banco Central (BC), de 6,5%, segue alta, como diz o economista Luís Fernando Azevedo, da Rosenberg & Associados. Nos 12 meses até junho, o indicador subiu 6,06%, o maior nível nessa base de comparação desde os 6,22% de novembro de 2005.
Uma das boas notícias do IPCA de junho foi o menor índice de difusão de preços, sugerindo pressões inflacionárias menos generalizadas. No mês passado, 67,2% dos itens do indicador aumentaram, um percentual inferior aos 71,4% de maio. A queda é um bom sinal, mas o número ainda é elevado, bastante acima da média histórica de 61,9%, aponta em relatório o economista Adriano Lopes, do Unibanco.
Uma boa surpresa foi a desaceleração de preços mais sensíveis à demanda. O grupo de serviços (como cabeleireiro, condomínio, conserto do automóvel) recuou de 0,52% em maio para 0,39% em junho. Outro bom termômetro da inflação de demanda é o núcleo calculado pela exclusão de alimentos e preços administrados. Ele caiu de 0,67% para 0,54%.
Para os analistas, porém, ainda é cedo para comemorações. Esperando uma desaceleração da economia nos próximos meses por conta do ciclo de alta de juros, o estrategista-chefe do BNP Paribas, Alexandre Lintz, considera prematuro classificar o resultado de junho como um sinal de que as pressões de demanda já começam a arrefecer. "O IPCA veio um pouco melhor do que se esperava, mas ainda está num patamar complicado", nota ele, que projetava um indicador de 0,85% - as estimativas apontavam para uma alta de 0,75% a 0,9%. O núcleo por exclusão continua rodando a uma velocidade bem superior ao do centro da meta, de 4,5%. Em termos anualizados, 0,54% equivale a 6,67%.
Azevedo diz que parte da melhora do resultado do IPCA de junho se deveu ao grupo vestuário, que teve alta de 0,42% em junho, bem abaixo do 0,98% do mês anterior. Os preços administrados (como tarifas públicas) também tiveram um comportamento favorável: subiram apenas 0,21%, menos que os já baixos 0,26% de maio. "Mas esse quadro deve mudar a partir deste mês", afirma Azevedo. Em julho, lembra ele, entrou em vigor o reajuste de 8,12% da Eletropaulo. Além disso, as fortes altas dos Índices Gerais de Preços (IGPs) devem jogar para cima os administrados, já que vários serviços públicos têm mecanismos de reajuste que levam em conta a variação desse indicador. Para Azevedo, eles podem subir até 4% no ano, o que implica uma aceleração forte em relação ao 1,78% registrados nos 12 meses até junho. Ele prevê um IPCA de 6,5% no ano, apostando em alta de 0,5% a 0,6% em julho.
Mesmo com a inflação menor prevista para este mês, o economista considera que o cenário para a inflação continua preocupante. "O resultado de 0,74% é o mais alto para o mês de junho desde 1996 e a taxa acumulada em 12 meses continua avançando", diz Azevedo, para quem há o risco de que as altas elevadas dos preços no atacado sejam repassadas para o varejo. Em 12 meses até junho, as cotações no atacado subiram 17,9%.
Lintz acredita que, no acumulado em 12 meses, o IPCA deve superar os 6,5% em agosto, quando deverá atingir 6,7%. Nessa base de comparação, o pico do ano deverá ser alcançado em novembro, quando o IPCA atingiria 7,4%. No ano fechado, o indicador deverá acumular alta 7,1%, projeta Lintz.
O economista-chefe da corretora Concórdia, Elson Teles, é um pouco mais otimista que Lintz. Ele diz que há incertezas, como a indefinição quanto aos preços de commodities, mas acredita que o IPCA pode terminar o ano em 6,5%. "Há 50% de a meta ser superada, mas isso não é um grande problema", afirma Teles, para quem o quadro inflacionário é delicado, mas não é alarmante. Ele prevê aumento de 0,5 ponto percentual dos juros neste mês. Lintz, de 0,75 ponto.
No IPCA de junho, os alimentos responderam por 63% da alta de 0,74%. O aumento de 2,11% foi a maior variação mensal do grupo desde os 2,15% de janeiro de 2003. Para ter uma idéia da magnitude, foi a mais alta para um mês de junho desde os 52,15% de 1994, às vésperas do Plano Real. A expectativa é que, daqui para frente, os alimentos subam menos. Teles prevê aumento de 4,3% no segundo semestre para esses produtos. No primeiro, eles subiram 8,64%. (Valor Econômico)
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