Bob Fernandes, do Terra Magazine:
Os intestinos do Brasil.
Daniel Dantas está numa sala da Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. Seu advogado, Nélio Machado, está próximo.
Diante do banqueiro, o delegado que coordenou a operação Satiagraha, o homem que o prendeu por duas vezes em 48 horas. São 8 da noite da quinta-feira, 10 de julho.
Outros dois dos presos na operação acabam de ser libertados, habeas corpus do presidente do Supremo, Gilmar Mendes, concedidos ao megainvestidor Naji Nahas e ao ex-prefeito Celso Pitta.
Daniel Dantas parece exausto, rendido, mas não deixou de ser quem é. Obcecado por tudo que foca e toca, brilhante, genial, dizem mesmo os mais empedernidos adversários.
O tempo, pouco tempo, dirá o quanto há de cálculo, quanto há de desabafo no que começa a despejar sobre o delegado Protógenes Queiróz. Primeiro, a senha:
- Eu vou contar tudo! Vou detonar!
Antes ainda, o delegado lhe passa um calhamaço, o relatório das investigações, o fruto de anos de investigações, e diz, na longa conversa informal:
- ...sua grande ruína foi a mídia...você perdeu muito tempo com isso, leia esse capítulo sobre a mídia e entenda porque você está preso...sua defesa começa aqui, com todo o respeito que eu tenho ao seu advogado aqui presente...
Daniel lê, atentamente.
O delegado volta à carga.
- Não continue jogando seus amigos, seus aliados contra mim, isso não vai adiantar nada, como não adiantou...
Daniel, silencioso, parece concordar. O delegado prossegue:
- Se esse jogo continuar, a cada vez serão mais dez anos de prisão... eu tenho pelo menos 5 preventivas contra você, o trabalho do juiz De Sanctis é extraordinário, não há como escapar de novos mandados...e se você insistir agora será com a família toda...serão duzentos anos de prisão...
Silêncio, Protógenes Queiroz fecha o cerco:
- ...vamos fazer um acordo, você me ajuda e eu te ajudo....
Daniel, aquele que é tido e havido como uma mente brilhante, decide. O tempo dirá se cálculo ou rendição:
- Eu vou contar tudo!
E faz jorrar, devastador:
-...vou contar tudo sobre todos. Como paguei um milhão e meio para não ser preso pela Polícia Federal em 2004...
- Um milhão e meio? À época da operação Chacal, o caso Kroll...?
Prossegue a torrente de Daniel:
- ...tudo sobre minhas relações com a política, com os partidos, com os políticos, com os candidatos, com o Congresso... tudo sobre minhas relações com a Justiça, sobre como corrompi juízes, desembargadores, sobre quem foi comprado na imprensa...
O delegado, avança:
- Vamos fazer um acordo, mas é ponto de honra você não mentir. Não abro mão dessa investigação e seus resultados, mas muito mais fundamental é contar tudo sobre a corrupção no Brasil...quero saber a quem você pagou propina no Judiciário, no Congresso, na imprensa...
Em meio à torrente, em algum momento o advogado Nélio Machado pondera:
- ...você vai estar mais seguro na cadeia do que fora, fora você correrá risco de ser morto!
Daniel Dantas, o obcecado por tudo que toca e foca, a mente brilhante, aquele que mesmo os inimigos dizem ser um gênio, despeja:
- Eu vou detonar tudo!
Tarde da sexta-feira 11 de Julho. Daniel Dantas está na Superintendência da Polícia Federal, São Paulo, para ser ouvido formalmente pelo delegado Protógenes Queiróz. Três e meia da tarde. O depoimento está começando.
O advogado Nélio Machado, à porta da PF, informou ao reportariado que vai orientar seu cliente para nada dizer.
O tempo, pouco tempo, dirá se tudo não passou de exaustão, desabafo.
Se tudo foi só cálculo, ou, um mergulho definitivo, purificador, nos intestinos do Brasil.
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