A imprensa livre é requisito essencial para a existência de uma sociedade democrática, mas o gozo dessa liberdade implica uma responsabilidade social, sobretudo tendo em conta a enorme influência que a imprensa exerce sobre a população. Transmitindo informações a imprensa pesa muito na formação das convicções e pode ter um peso fundamental tanto para a consagração de posições favoráveis à dignidade e aos direitos fundamentais da pessoa humana, quanto para o estabelecimento e a alimentação de preconceitos ou de conclusões injustas.
Um fato recente é bem ilustrativo de uma circunstância em que essa responsabilidade ficou esquecida e a imprensa adotou um comportamento anti-social em relação a um fato determinado, distorcendo dados e deixando evidente que algo influiu para o tratamento irresponsável da informação. Recentemente, ocorreu a prisão de um favelado do Rio de Janeiro que já teve participação em atividades criminosas e ficou preso durante três anos e oito meses pelo crime de porte ilegal de armas.
Saindo da prisão, em liberdade condicional, esse homem, de acordo com suas próprias palavras, ainda manteve a ligação com os traficantes, não sendo possível o seu desligamento imediato. Mas, segundo afirmou, há mais de um ano obteve a concordância dos criminosos para mudar de vida e desde então passou a trabalhar em atividade honesta e legal, conseguindo emprego como vigilante, contratado pela OAS, empresa responsável por obras que vêm sendo realizadas nas favelas, dentro do programa do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), do governo federal.
Esse homem foi preso no final de abril, em sua residência. Não houve flagrante e a Polícia não se baseou em qualquer fato criminoso de cuja prática ele tenha sido acusado. No momento da prisão ele mostrou aos policiais seu crachá de empregado da OAS, ou seja, mostrou que tem emprego regular numa grande empresa, devendo cumprir, portanto, as obrigações decorrentes do contrato de trabalho.
O tratamento dado pela imprensa à sua prisão deixa evidente uma distorção, que pode decorrer de preconceito ou então do propósito de alimentar a suspeita de que o governo federal protege criminosos. Com efeito, os dois jornais paulistas de maior circulação no país, O Estado de São Paulo e a Folha de São Paulo deram manchetes sobre o caso, em suas edições do dia 29 de abril, um dizendo "Acusado de tráfico trabalha em obra do PAC" e outro proclamando que "Suspeito de tráfico é preso com crachá do PAC".
Um aspecto expressivo é que este último ilustrou a matéria com fotografia do crachá, vendo-se claramente que nele constam o logotipo e o nome da OAS e o nome do vigia, sem qualquer referência ao PAC. O crachá é da OAS, para quem ele trabalha, e não do PAC.
É oportuno ressaltar que a busca de reintegração social dos ex-presidiários é trabalho do mais elevado significado humano e social, pois é o caminho para afastá-los das atividades criminosas, havendo o reconhecimento universal da necessidade de apoio a essa reintegração e de seus efeitos muito positivos. É exagero a Polícia suspeitar, sem apoio em qualquer fato, que todos os ex-traficantes que buscam um emprego, com carteira de trabalho, estão apenas querendo proteger-se da Polícia.
Com precisão e clareza, o responsável pela obra da OAS ressaltou alguns pontos que são fundamentais para avaliação do caso: "a exigência de ‘nome limpo’ é conduta discriminatória e causa danos morais e materiais irreversíveis, por estar atingindo a dignidade da pessoa e criando obstáculos às oportunidades de emprego". Se houver suspeita a Polícia deve investigar e buscar dados concretos, efetuando a prisão desse e de outros ex-presidiários se houver base legal para a prisão preventiva. Mas ao noticiar os fatos a imprensa não deve afastar-se de sua responsabilidade social.
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