Decisão do Supremo fortalece indignação popular e reação de parlamentares que se rebelaram contra o aumento de 91%. O STF entendeu que as mesas diretoras da Câmara e do Senado não têm poder para legislar em causa própria na questão dos salários
Por unanimidade, ministros do STF consideram ilegal o reajuste de 90,7% a parlamentares baseado em decreto legislativo. Para o tribunal, qualquer mudança nos salários precisa ser aprovada em plenário
O Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu ontem o Congresso de aumentar para R$ 24,5 mil os salários dos parlamentares por entender que a medida se baseou em decreto legislativo sem validade. Os ministros concluíram também que, para alterar seus vencimentos, os congressistas terão de votar e aprovar novo projeto em plenário na Câmara e Senado — e não por meio de ato das Mesas Diretoras das duas Casas. A decisão ocorreu durante julgamento de mandado de segurança de autoria dos deputados Raul Jungmann (PPS-PE), Fernando Gabeira (PV-RJ) e Carlos Sampaio (PSDB-SP).
Por 10 votos a zero, os ministros do Supremo decidiram brecar a edição de atos normativos por parte das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado para alterar os subsídios de deputados e senadores com base no Decreto Legislativo nº 444, de 2002. Para o STF, o decreto caducou após a Emenda Constitucional 41, de 2003. “Voto no sentido de que, com base nele, não possam vir a ser afirmados novos valores de remuneração dos membros do Congresso Nacional, menos ainda sob a forma de equiparação a qualquer outro cargo”, afirmou o relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski.
Encerrada a sessão, a última realizada pelo Supremo em 2006, o ministro Marco Aurélio Mello negou atrito entre os poderes Judiciário e Legislativo por conta do julgamento. “Está de parabéns a democracia. Não houve choque entre instituições”, afirmou o magistrado. Marco Aurélio explicou ainda que o reajuste dos salários de deputados e senadores pode ser decidido a qualquer momento, “não precisando mais ser feito em uma legislatura para ter validade na seguinte”.
A decisão do Supremo ocorreu no dia em que o país assistiu novamente a uma onda de protestos contra a tentativa de reajuste no Legislativo federal (leia mais na página 4). As atenções se voltaram para o STF, que incluiu na pauta de ontem a ação direta de constitucionalidade (Adin) proposta pelo PPS contra o aumento. A Adin contestava o reajuste de 90,7% concedido aos parlamentares pelas Mesas da Câmara e do Senado na semana passada, alegando ser inconstitucional o Decreto Legislativo nº 444, que respaldou o aumento aos congressistas.
A votação da Adin estava em seis votos favoráveis à ação do PPS e pareceria caminhar para a suspensão do aumento, mas o ministro Marco Aurélio alegou que o decreto já não está mais em vigor e, com isso, a ação perderia a razão de existir e não seria julgada pelo tribunal. O argumento prevaleceu e a Adin deixou de ser julgada. Apesar disso, naquele momento, os ministros procuraram frisar que o Congresso descumprira a legislação ao propor reajuste de subsídios com base no Decreto nº 444.
Mandado
Foi o caso de Sepúlveda Pertence, para quem “o aumento só poderia ser concedido por decreto legislativo aprovado pelo plenário do Senado e da Câmara e não pelas mesas diretoras das duas casas”. Ao proclamar a avaliação sobre a Adin, a presidente do tribunal, ministra Ellen Gracie, declarou também que se quiser reajustar salários de parlamentares, “o Congresso precisaria fazer por meio de regra específica, aprovada pelo plenário, e não por meio das Mesas Diretoras das duas Casas”.
Com a análise sobre a Adin, o STF sinalizou para o Senado e para a Câmara que, somente a partir da aprovação de um novo decreto legislativo, as mesas diretoras das duas casas poderão viabilizar o aumento de 90,7%. Mais tarde, porém, a ministra Ellen Gracie resolveu colocar em pauta o mandado de segurança dos deputados Jungmann, Gabeira e Sampaio, no qual argumentavam que as Mesas Diretoras não poderiam determinar o aumento sem que a decisão passasse pelo plenário das duas Casas. Por 10 votos a zero, os ministros decidiram que somente com um novo decreto legislativo, votado e aprovado pelos plenários da Câmara e do Senado, os parlamentares poderão reajustar os salários.
A reação foi imediata no Congresso. Os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiram convocar os líderes partidários para discutir uma nova forma de conceder o reajuste (leia mais na página 3). Renan Calheiros disse esperar que os plenários da Câmara e do Senado votem o aumento ainda esta semana e defendeu a fixação de um teto para os parlamentares, dizendo que é moralizante ter um limite de salários, embora não tenha dito qual.
personagem da notícia
Novato dá parecer decisivo
O relatório que barrou, pelo menos por enquanto, o reajuste que praticamente dobraria os salários de deputados e senadores é de autoria do ministro Ricardo Lewandowski, um dos mais recentes integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF). Quinta indicação do Presidente Lula para o tribunal, ele despertou a atenção do Congresso logo que teve seu nome confirmado.
Lewandowski orientou tese de doutorado sobre um dos temas mais polêmicos da relação entre o Legislativo e o Judiciário federais: a atuação das comissões parlamentares de inquérito (CPIs). De autoria do jurista Uadi Lammêgo Bulos, a tese retrata o instituto e uso das CPIs no Brasil. O autor defende que o Judiciário deve interferir no funcionamento de CPIs, se essas ferirem princípios fundamentais do Direito.
Lewandowski tem 58 anos e, entre 1997 e 2005, foi desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Tem extensa carreira acadêmica, a maior parte dela na Universidade de São Paulo (USP), onde leciona desde 1978. Nascido em São Bernardo do Campo, Lewandowski é amigo pessoal do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, mas não tem relações políticas profundas com a esquerda. É visto como um jurista de perfil conservador.
Helena
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