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terça-feira, 10 de novembro de 2015

Sumiram com os cadáveres



Governador tucano  precisa discutir sua relação com a transparência


 Mortes causadas por PMs somem de estatísticas da gestão Alckmin

Os assassinatos cometidos por policiais militares em agosto e setembro deste ano em São Paulo desapareceram das estatísticas oficiais divulgadas pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB).

Justamente nesses dois meses ocorreu uma série de mortes atribuídas a policiais militares –na capital e na Grande São Paulo–, entre chacinas e assassinatos de suspeitos já rendidos.

Cerca de 30 policiais militares foram presos sob a suspeita de participação em pelo menos 31 mortes nesse período –entre elas as 23 vítimas das chacinas de Osasco e Barueri, em agosto.

Há ainda nessa lista de excluídos dos dados oficiais os quatro adolescentes mortos ao lado de uma pizzaria em Carapicuíba, em setembro. Eles teriam sido assassinados por agredirem a mulher de um PM –que está preso sob a suspeita dessas quatro mortes.

Nenhum desses episódios aparece nas estatísticas divulgadas pelo governo no "Diário Oficial" do Estado. A coluna de homicídios praticados por policiais de folga aparece zerada entre julho e setembro deste ano.

Conforme mostrou reportagem da Folha publicada nesta segunda (9), uma manobra estatística do governo Alckmin ampliou a queda dos homicídios em São Paulo. A mudança de metodologia começou em abril, sem divulgação, quando a gestão tucana passou a excluir das estatísticas de homicídios dolosos as mortes cometidas por PMs de folga em legítima defesa.

A estratégia permitiu ao Estado retirar, em apenas seis meses, 102 mortes das estatísticas oficiais de homicídios –equivalentes a mais de cinco chacinas como a ocorrida em 13 de agosto em Osasco e Barueri (Grande SP).

Nos dados do terceiro trimestre deste ano (julho, agosto e setembro) há registro de apenas um único assassinato por policial em serviço, mesmo que no período tenham sido presos pelo menos 25 policiais militares.

Quatorze deles são homens da Rota suspeitos de terem matado dois homens em Pirituba (zona norte).

Os outros 11 são PMs envolvidos na morte de dois jovens no Butantã (zona oeste), em setembro. Imagens gravadas por vizinhos mostraram que os dois homens estavam rendidos pelos policiais quando foram mortos, um deles após ter sido atirado do telhado de uma casa.

Em nota, o governo Alckmin informou que os homicídios praticados por policiais, "seja por meio de chacinas ou em crimes comuns", sempre foram computados nas estatísticas mensal e trimestral (leia mais abaixo).

INCOMPARÁVEIS

Nas estatísticas do terceiro trimestre de 2014, há o registro de uma série de mortes com características semelhantes, provocadas por policiais. Entre julho e setembro do ano passado, a gestão tucana registrou a morte de 26 pessoas nessas circunstâncias.

Assim, a redução obtida pelo governo no terceiro trimestre deste ano –comparando com igual período de 2014– chegaria a mais de 96%.

Todos esses homicídios integram as estatísticas de homicídio comum.

REJEIÇÃO

O desaparecimento dos casos de homicídio doloso praticados por PMs (de folga ou em serviço) das estatísticas oficiais coincide com o início da manobra adotada pelo governo de São Paulo, a partir de abril deste ano.

Antes, os assassinatos cometidos por policiais de folga eram contados como homicídios dolosos. Agora, porém, são registrados como intervenção policial.

As notícias de envolvimento de policiais em chacinas e assassinatos de presos rendidos ocorrem no momento de piora da imagem da polícia paulista, segundo recente pesquisa Datafolha.

O levantamento mostra que 60% dos paulistanos têm medo da PM –a reprovação da Polícia Civil é um pouco menor, embora não menos ruim: 55% dizem desaprová-la. Quase um terço confessa ter tanto medo da polícia quanto de bandidos. Informações da Folha

CASOS NÃO CONTABILIZADOS

> 6.ago.2015
Duas pessoas foram assassinadas em Pirituba, na zona norte da capital. 14 policiais da Rota foram presos

> 13.ago.2015
Ao menos 23 pessoas morreram na chacina em Osasco e Barueri (Grande SP). Seis PMs e um guarda municipal estão presos

> 7.set.2015
Dois suspeitos morreram no bairro do Butantã (zona oeste). Um dos homens foi jogado de um telhado. Onze PMs foram presos

> 19.set.2015
Quatro adolescentes são assassinados em Carapicuíba; três policiais foram presos 

  Sumiram com os cadáveres

 O governo Geraldo Alckmin precisa discutir sua relação com a transparência. Primeiro foram os constrangedores episódios em que, sem apresentar razões plausíveis, impôs sigilo sobre dados da Sabesp, do Metrô e sobre informações financeiras da Polícia Militar. Teve de voltar atrás. Agora, descobrimos que a administração também altera estatísticas policiais sem informar claramente o público. Obviamente, é uma mudança que faz com que o governo fique melhor na foto.

Como mostraram os repórteres Rogério Pagnan e Lucas Ferraz, desde abril a gestão tucana vem excluindo das estatísticas de homicídios dolosos as mortes provocadas por policiais militares em folga que supostamente agiram em legítima defesa. Com isso, saíram da lista de homicídios 102 óbitos, que passaram a ser contabilizados em separado, como decorrentes de intervenção policial.

O efeito da exclusão não é pequeno. Pelo novo critério da Secretaria da Segurança Pública (SSP), a redução dos homicídios no Estado em 2015 (até setembro) foi de 13,2% contra igual período de 2014. Pelo padrão antigo, ela ficaria em 8,1%.

Conceitualmente, penso que, como estatísticas não devem encerrar juízos morais, os assassinatos e as mortes decorrentes de intervenção policial deveriam, no cômputo final, ser somados. Um homicídio é, afinal, um homicídio, mas reconheço que autoridades devem ser livres para tentar aperfeiçoar a metodologia de suas estatísticas. É óbvio, porém, que precisam agir com total transparência. O IBGE, por exemplo, altera seus procedimentos, mas sempre avisa com antecedência e toma o cuidado de divulgar as séries históricas com e sem a mudança. Não a esconde sob um asterisco, como fez a SSP.

Dados e estatísticas são o principal instrumento que a sociedade tem para descobrir o que está acontecendo à sua volta e promover mudanças. É assunto sério demais para ser manipulado ao bel-prazer de políticos.

1 Comentários:

Maria Diana disse...

ISSO É TÍPICO DAS MILICIAS!��������������������������������
SUMIR COM AS PROVAS DO CRIME!

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