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domingo, 12 de julho de 2009

Você acredita nisso?:Heráclito diz que empregou filha de FHC, "porque ela precisava trabalhar pra viver"


Heráclito Fortes, o "moralizador da crise", conta que deu emprego à filha de FHC "porque ela precisava trabalhar pra viver"

José Sarney está abatido. Na cadeira em que preside a sessão do Senado, na terça-feira, tem o ar grave, circunspecto. Todos os partidos, fora o PMDB, pedem que saia do cargo. "Eu sou médico, cirurgião, pós-graduado. Pode colocar aí: o presidente Sarney não está deprimido", diz o senador Mão Santa (PMDB-PI). "Ele tem é um comportamento compatível com a idade dele. E outra: você deve muito a esse homem. José Sarney fez a transição democrática neste país sem o registro de nenhuma morte!"

Mas, senador, o presidente parece pálido, talvez a crise... "Que crise? Crise nenhuma!! Um jornal e um repórter valem pela verdade que dizem, meu caro!! Sabe o que dizia Wisom Xôchou?". Quem? "Winston Churchill", diz o assessor, ajeitando a gravata do chefe.

Os jornalistas que fazem reportagens sobre o Senado ficam em um cercadinho na margem esquerda do plenário. Para conversar com um parlamentar, é preciso esperar que ele olhe (sem ignorar). Com o dedo polegar e o indicador, fazendo sinal de "por favor, só um minutinho", o jornalista deve usar uma expressão de clemência (foi assim com Mão Santa). Quase sempre o parlamentar atende ao apelo.

Quando o jornalista cruza com um senador do lado de fora do plenário, tem de estar preparado para correr atrás dele, em galerias cobertas por grossos tapetes azuis. O repórter Paulo Sampaio, enviado na semana passada a Brasília, apressa o passo atrás de Renan Calheiros. O senador pernambucano Jarbas Vasconcelos, do PMDB, dissera há pouco que Renan "manda em todo mundo no Senado, menos em mim e no Pedro [Simon] (PMDB-RS)". Renan acelera. O repórter quase corre atrás dele. "Não quero falar. Eu também fui presidente, isso acaba sendo divulgado...", diz o senador.

A terça-feira foi particularmente agitada na Casa. Comemoravam-se os 15 anos do Plano Real, com as presenças de Fernando Henrique Cardoso e Aécio Neves, acomodados entre Sarney e a governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius, alvo de investigação que apura improbidade administrativa em seu Estado.

"Coitados, sentaram os dois [FHC e Aécio] entre os "caindo de podres". Olha a cara do Aécio", ri baixinho um jornalista. À saída, Aécio é cercado por câmeras de TV e por um bolinho de assessores e jornalistas. Acha que a Yeda queimou seu filme, governador? "Nada, isso não contamina, não. Cada um tem seus problemas."

Os jornalistas podem frequentar também o café que fica ao fundo do plenário do Senado e se sentar com os parlamentares para tomar um chazinho, um suco e comer bolachinhas. O lugar tem as paredes brancas, mesas redondas e um biombo na entrada da cozinha. Ali, é um permanente entra-e-sai. Mesmo quem está envolvido em alguma situação delicada parece tranquilo. É o caso do primeiro-secretário Heráclito Fortes (DEM-PI). Responsável, no momento, por "moralizar a crise", empregou em seu gabinete Luciana Cardoso, filha do ex-presidente FHC, que recebia para trabalhar em casa.

Heráclito leva à boca uma colherada de um minifrapê diet de abacaxi, servido pela copeira do café. Depois que se submeteu à cirurgia de redução do estômago, ele precisa fazer sete refeições pequenas por dia. Já perdeu 25 kg (de 125 kg).

O democrata diz que Luciana foi "injustiçada". "A menina precisava trabalhar pra viver. Quando o Fernando Henrique foi embora do Palácio da Alvorada, me disse: "Nossa maior preocupação é a Luciana, que precisa ficar em Brasília". O marido dela é funcionário público, trabalha no Itamaraty, entende? Então, eu disse: "Não se preocupe, presidente". Ela organizava recortes para montar uma biografia minha. A Luciana é tão correta que, quando a dona Ruth estava muito mal, em São Paulo, ela pediu autorização para ficar com a mãe. Depois da morte, ela me ligou perguntando se podia ficar mais uns dias. Numa situação daquelas, ainda perguntou se podia, entende?"

Tião Viana (PT-AC), um dos mais atuantes do "grupo ético", atende ao chamado de "um minutinho" do repórter e prega, pela enésima vez, o afastamento do maranhense José Sarney da presidência do Senado.

Quando se pergunta como sua filha conseguiu gastar R$ 14 mil em telefonemas de celular, disparados do México e pagos pelo Senado, Viana faz uma expressão de quem acabou de comer um pirarucu estragado. "Já disse o que tinha de dizer sobre isso. Deixa cicatrizar. O Jarbas Vasconcellos passou dois meses sem falar, eu também tenho direito. O dinheiro não é do Senado, é meu." Vai pagar em quantas vezes mesmo? 72? "Depois a gente fala, amigo..."

Na galeria atapetada, o senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) dá entrevista para uma TV e defende a saída de Sarney. A reportagem aproveita o ensejo. Senador, ficou a dúvida: foram R$ 10 mil ou US$ 10 mil (emprestados a ele por Agaciel Maia)? "R$ 10 mil", diz ele, com a bochecha intumescida e vermelha. "Eu estava numa situação, mestre, em que você faria a mesma coisa [pedir R$ 10 mil a um assessor que pediu ao diretor-geral do Senado]. Naquela situação, não existe santo. Qualquer ser humano faria. Já está tudo saldado."....Mentira!

Logo depois, o repórter recebe um telefonema de Sandra Ibiapina, assessora de Virgílio, convidando para um cafezinho no gabinete. "Você pegou o senador meio acelerado, venha até aqui conversar comigo com calma", sugere.

Apesar dos escândalos administrativos, a pauta do dia entre as secretárias e assessores parlamentares é o bunker de cerca de 140m2 que Agaciel mantinha, entre o andar de seu gabinete e o debaixo, para reuniões secretas e, segundo a revista "Época", encontros íntimos [teriam sido encontrados no local um DVD do filme pornô "Tardes Molhadas" e um tubo do lubrificante KY pela metade, com validade de dezembro de 2009]. A matéria também fala do BMW de Cristiane Tinoco, secretária de Agaciel.

Sandra Ibiapina conta que Cristiane -que começou como secretária- mandou um e-mail aos senadores explicando que é solteira e que o BMW foi comprado por ela para realizar um "sonho de final de juventude".

Nos túneis de mármore e corredores que ligam os vários prédios anexos do Senado, funcionárias usando sapatos altos e bolsas grandes recebem beijocas sapecadas por parlamentares de passagem. Às vezes, eles param para cumprimentá-las olhos nos olhos, segurando no queixo, alisando a escova definitiva. "O Senado sempre foi uma casa de tolerância", diz no plenário o senador Cristovam Buarque (PDT-DF). Depois, tenta explicar: "Quis dizer que a Casa sempre teve muita tolerância nas relações pessoais. Entendeu?"

Volta e meia toca uma sineta estridente, tipo recreio, ouvida em todo o prédio. É para chamar os parlamentares para sessões ou avisar que algum deles falou demais, além do tempo regulamentar. Nesse caso, o presidente Sarney, que passa a maior parte do tempo estático, mexe os dedinhos em um painel para abaixar o volume do microfone de quem abusou no discurso.

Num intervalo, a reportagem sobe ao 9º andar do Anexo 1, para visitar e entender melhor o setor que cuida dos serviços de "Direitos e Deveres" e o de "Qualidade de Vida e Reabilitação Funcional". Entra na primeira sala, onde há três funcionários. Pergunta que direitos e deveres são aqueles. "Menino do céu, todos os que a lei 8.112 regulamenta", explica uma senhora de bochechas artificialmente rosadas, sombra colorida e batom forte.

Entre outros direitos, a lei 8.112 regulamenta horas extras, gratificação natalina e adicional por atividades penosas. No rol dos deveres, está cumprir as ordens superiores, exceto as manifestamente ilegais.

Na sala da qualidade de vida e reabilitação funcional, a chefe, Denise Costa, se senta ao lado de uma bolsa preta lustrosa Guess. Apesar do cargo, ela diz que não tem autonomia para falar sobre o programa: "Diante da situação da casa, nós não podemos dar informações". Muita gente a ser reabilitada, Denise? Ela precisa de autorização da "doutora Dóris Marize", diretora de RH, para responder.

Denise pede para o repórter aguardar a chegada do assessor de imprensa. Na presença dele, ela já pode falar. Mas é difícil entender quais são as "várias ações do programa". Ela começa pelas "não ações". "Funcionário comissionado não é contemplado", explica. A "atividade corporal de integração vai ser implementada com o tempo". E "outras atividades, no segundo semestre".

De volta ao plenário, a coluna avista a cabeleira do senador Wellington Salgado (PMDB-MG), vulgo "Cabelo", que pagou com verba de seu gabinete uma jornalista da rádio Itatiaia, de BH, para fazer releases radiofônicos do ministro Hélio Costa, das Comunicações. "Eu não vou enfartar por causa dos outros. Se você quer saber, tô perdendo dinheiro aqui. Meu valor HH (homem-hora) lá fora é muito maior", diz o senador, que é dono de universidade.

No entendimento de Salgado, o que deflagrou escândalo na Casa foi "a modernidade e a informática, que tornaram tudo muito transparente". "Você tem que ver que o Senado é uma casa de idosos, de gente da época do telefone." Mônica Bergamo

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